São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 1994
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A ligadura de trompas

JOSÉ RODRIGUES FILHO

Ao discutir a questão do aborto, a Folha enfatiza o dever do "poder público de realizar com urgência uma campanha ampla e séria, como nunca se fez neste país, de estabelecimento sobre métodos anticoncepcionais".
Apesar da inexistência de uma política de planejamento familiar no Brasil. O governo financia de forma desorganizada um número abundante de lugadura de trompas e mulheres das zonas urbana e rural. Hoje, em várias regiões do país, mais de 40% das mulheres em idade fértil estão esterelizadas, comprometendo o crescimento populacional para os próximos anos. Neste campo, a lógica do nosso sistema de saúde está direcionada por princípios de rentabilidade, através da realização de levadas taxas de cesáreas e de laqueadura de trompas.
A mulher brasileira conta hoje basicamente com apenas dois métodos contraceptivos: laqueadura de trompas (cerca de 40%) e pílula (outros 40%). Outros métodos contraceptivos (DIU, camisinha etc) são utilizados de forma insignificante. Em alguns países desenvolvidos o percentual de mulheres submetidas à ligadura é inferior a 10%.
O controle de natalidade no país deve ocorrer de forma voluntária e consciente, devendo ser amplamente discutido pela sociedade, dentro de princípios éticos. Se foi possível diminuir o diferencial de fertilidade entre as classes ricas e pobres, sabe-se que a distribuição de renda no país permanece cada vez mais acentuada.
Assim sendo, questões inerentes à ocupação do espaço físico, miseralidade e crescimento econômico devem ser reexaminadas. Não é admissível que o controle de natalidade continue ocorrendo de forma desorganizada e irresponsável, com o acúmulo de capital para alguns, e o desespero e frustração de milhões de mulheres submetidas à esterilizações irreversíveis.
Infelizmente, vivemos num país que não conseguiu ainda realizar uma melhor gestão da terra que viesse melhorar as condições de vida de milhares de pessoas do campo, mas está conseguindo realizar uma "reforma de reprodução". Já foi dito que a democratização do controle da reprodução é tão importante quanto a democratização da propriedade da terra, sobretudo numa região como o Nordeste brasileiro.
Neste sentido, tanto o aborto como o planejamento familiar são questões que a sociedade brasileira, o governo e, principalmente a Igreja Católica, não podem continuar ignorando.

fim

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