São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ministro do STJ não aceita controle externo

EDIANA BALLERONI; EUMANO SILVA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Antônio Pádua Ribeiro –um dos 33 integrantes do STJ (Superior Tribunal de Justiça)–, não aceita qualquer tipo de controle externo do Judiciário. Ele não fala apenas em seu nome. O magistrado coordena uma comissão de integrantes do STJ formada para apresentar à revisão constitucional propostas de aprimoramento da Justiça.
"O dia em que a Justiça for tutelada, os atingidos serão os cidadãos brasileiros", disse o ministro. Pádua Ribeiro não quis comentar a posição do STF (Supremo Tribunal Federal), que passou a admitir o controle externo. Mas exibiu, orgulhoso, os resultados de uma pesquisa feita entre juízes de cinco Estados: 69,6% classificaram a atuação do STJ como boa ou ótima, que ficou em primeiro lugar na consulta. O STF ficou em terceiro. A seguir, os principais trechos da entrevista à Folha:
Folha - Quais são os problemas que provocam a morosidade do Judiciário?
Ministro Antônio Pádua Ribeiro - Em grande parte decorre da crise em que vivemos. A sociedade tem se mostrado muito instável e isso se reflete na obra legislativa. O próprio Poder Executivo, com seus sucessivos planos econômicos, tem abastecido o Poder Judiciário de causas evidentemente em número muito grande. O Poder Legislativo, em razão da alteração legislativa muito rápida, não tem tido tempo para atualizar leis importantes –como o Código Penal, que data de 1940. Muitas leis são arcaicas e não se ajustam aos interesses atuais da coletividade. A estabilidade econômica tornaria a Justiça mais ágil.
*
Folha - Um dos argumentos usados no Congresso a favor da criação de um controle externo do Judiciário é que esse controle apressaria a tramitação dos processos. O senhor concorda?
Pádua Ribeiro - Acredito que um Conselho de Justiça precisa ser criado, mas apenas com a função de aprimorar os sistemas de controle interno hoje existentes, que são os conselhos de Justiça nos Estados e nos tribunais federais.
Folha - O controle externo pretendido no Congresso teria a participação de juristas e membros do Ministério Público. Qual a sua objeção à participação dessas pessoas no Conselho de Justiça?
Pádua Ribeiro - É uma questão de princípio. Desde as Ordenações do Reino que o Judiciário sempre exerceu o controle de si próprio. No encerramento da CPI do Orçamento, o senador Mário Covas disse que um poder que não tem meios de autocontrolar-se não tem condições de ser poder. Eu assino embaixo.
Folha - Essas suas opiniões não são corporativistas?
Pádua Ribeiro - Quando um juiz está contra o controle externo da magistratura, ele não está a defender salários nem vantagens. Ele está exatamente a lutar em benefício da coletividade. O dia em que a Justiça for tutelada, os atingidos serão os cidadãos brasileiros. O juiz deve decidir de acordo com as leis e a sua consciência. Se ele passar a sofrer reflexos de controles externos, essa sua atuação em benefício da coletividade passa a ser prejudicada.
Folha - O STF (Supremo Tribunal Federal) era contra o controle externo, mas agora já está aceitando que esse controle seja feito com a participação de pessoas alheias ao Judiciário. A que se deve a posição divergente entre o STF e o STJ?
Pádua Ribeiro - Não conheço ainda a posição do STF. Não cabe sobre ela me manifestar porque sou integrante de um outro tribunal e quando nada cometeria uma falta de cortesia.
Folha - O sr. é membro de uma comissão do STJ que está analisando as discussões sobre o Judiciário na revisão constitucional. O sr. poderia citar algumas das sugestões feitas pela comissão apresentadas em forma de emendas por parlamentares?
Pádua Ribeiro - Uma delas diz respeito ao próprio Conselho Nacional da Magistratura. Outras, a medidas para agilizar a administração da Justiça, como o problema dos precatórios, as súmulas com efeito vinculativo e também o mandado inibitório.
Folha - O sr. disse que as punições feitas dentro do Judiciário, inclusive por corrupção, muitas vezes não são tornadas públicas. Por que não são divulgadas e por que é tão difícil punir?
Pádua Ribeiro - O Judiciário, por tradição, não tem tornado públicas essas punições por entender que roupa suja se lava em casa. Mas as punições têm ocorrido com frequência, basta que se faça um levantamento nos Conselhos de Justiça. É uma rotina antiga do Judiciário. Mas tivemos a divulgação, por exemplo, dos casos ocorridos no Rio de Janeiro, relativos ao INSS.
Folha - Qual a dificuldade para punir?
Pádua Ribeiro - A dificuldade de punir é a mesma de qualquer processo judiciário punitivo. Há de se cumprir as leis e essas leis asseguram amplo direito de defesa. Às vezes se fala muito que um juiz comete falhas, mas ninguém faz uma denúncia concreta, não se apresentam provas.
Folha - O sr. acha o Judiciário mais corrupto do que os outros poderes?
Pádua Ribeiro - Acredito que não. Em primeiro lugar, as verbas públicas destinadas ao Judiciário não chegam a 2% de todo o Orçamento da República. A Justiça é um poder extremamente transparente, porque as partes podem acompanhar os processos.
Folha - O impeachment de Fernando Collor de Mello e a CPI do Orçamento são apontados como exemplos de uma limpeza feita no Executivo e no Legilativo. O Judiciário também precisa de uma limpeza?
Pádua Ribeiro - Esse tema precisa ser examinado tendo em conta a peculiaridade dos Poderes. O Executivo é estruturado de forma hierarquizada, o presidente da República tem poderes sobre todos os seus subordinados, desde os ministros aos funcionários de menor hierarquia. Isso já não acontece no Judiciário, que é formado de estamentos, cada tribunal tem autonomia. Esses estamentos são criados em prol da administração isenta da Justiça. Portanto, é difícil conceber uma providência semelhante a essa que foi adotada no Executivo. O mesmo se diga em relação ao Legislativo. Suas peculiaridades são diversas. A questão dos crimes de responsabilidade deve ser analisada de maneira diversa em cada um dos poderes.

Texto Anterior: Sem-terra invade fazenda da Petrobrás
Próximo Texto: Itamar permitiu entrada de mulheres
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.