São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 1994
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Um homossexual é morto no Brasil a cada 4 dias

DANIEL CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Pelo menos um homossexual é assassinado no Brasil a cada quatro dias, segundo pesquisa feita pelo antropólogo Luis Mott, presidente do Grupo Gay da Bahia (GGB). O estudo vai virar denúncia internacional através do relatório "A Violação dos Direitos Humanos de Gays e Lésbicas no Brasil", que será lançado no final do ano em São Francisco (EUA). O documento, atualmente em fase de redação, terá edições em português e em inglês. Será editado pela Comissão Internacional de Defesa dos Direitos de Gays e Lésbicas, da Califórnia (EUA).
A maioria dos crimes contra homossexuais ocorre na faixa entre São Paulo e Bahia. A pesquisa aponta o Rio de Janeiro como o Estado campeão de casos –35% dos 1.200 assassinatos registrados pela imprensa (fonte do estudo) entre 1980 e 1993 (período do levantamento). Só em janeiro, cinco homossexuais foram mortos no Rio, dois deles estrangeiros.
Segundo a pesquisa de Luis Mott, a maioria das vítimas são homossexuais masculinos (71%), mortos dentro de suas próprias casas (46%), por garotos de programa (84% dos assassinos). "A explicação é que o garoto resolve assaltar o cliente e, para não deixar pistas, acaba matando", diz Mott.
"A maioria dos crimes é cometida por garotos de programa, cujo principal objetivo é roubar", confirma o delegado Marco Antonio Desgualdo, titular da 1ª Delegacia de Homicídios de São Paulo. Desgualdo chefiou a equipe que esclareceu o assassinato do empresário Aparício Basílio da Silva, morto em 92 com 97 perfurações.
Travestis são o segundo maior grupo de vítimas (23%). São assassinados nas ruas, principalmente por "serial killers" e grupos de extermínio –14 dessas organizações criminosas devem ser citadas no relatório. Lésbicas completam a estatística com 6% dos casos.
Os homossexuais quase sempre são mortos de forma cruel. Segundo Mott, a maioria das vítimas sofreu algum tipo de tortura, como tesouradas superficiais, depilação, raspagem da pele, espancamento e até castração. O levantamento aponta ferimentos a tiro como a principal causa de morte (38%), seguida de perfurações (24%) e estrangulamentos (11%).
O baixo índice de punição dos assassinos (só 10%, segundo a pesquisa) revolta as ONGs gays. "Parece que matar um homossexual e matar um cachorro são a mesma coisa no Brasil", desabafa Mott. O autor da pesquisa diz que é comum o acusado ser absolvido na Justiça alegando que matou em legítima defesa. "Geralmente o garoto de programa afirma que praticou o crime porque o cliente o teria forçado a ser passivo."

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