São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 1994
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Poder leva executivas a molestar seus subordinados

"USA Today", de Arlington

JULIA LAWLOR

Uma chefe roça os seios contra as costas de um subordinado e o convida a entrar para o "harém" dela. Uma gerente beija na boca operários de sua empresa e faz comentários sexuais explícitos. Impossível? Não mais. À medida que aumenta o poder das mulheres no trabalho, surgem queixas de homens que acusam suas superiores de molestamento sexual.
O tema está em "Disclosure", novo romance de Michael Crichton (autor de "Jurassic Park"). Segundo Crichton, a trama do livro, sobre uma executiva que atrai um subordinado e o coage a manter relações sexuais com ela, se baseia num incidente verí
dico.
"As mulheres são tão capazes de exploração e agressão sexual quanto os homens", diz a escritora Naomi Wolf, argumentando que as mulheres precisam parar de se enxergar como vítimas impotentes e reconhecer seu próprio poder. "As mulheres costumam
ser retratadas como 'anjos de candura' e os homens como 'bestas brutais'. Precisamos reconhecer nosso próprio lado sombrio", diz ela.
Pesquisa realizada em 1988 revelou que 15% dos homens norte-americanos disseram ter sido sexualmente molestados no trabalho. Alguns dos casos envolviam investidas homossexuais. Apesar disso, mais de 90% das queixas de molestamento sexual em 1992 foram feitas por mulheres.
O advogado Mark Baloga, de St. Paul (Minnesota, centro-norte dos EUA), ganhou US$ 105 mil em outubro passado num processo movido contra Paula Maccabee, ex-vereadora de St. Paul. Baloga, que trabalhou como assessor de Maccabee de 1990 a 1991, acusou-a de tocar em suas coxas, esfregar seus seios contra suas costas e procurar convencê-lo a integrar seu "harém". Maccabee nega as acusações e diz que seu assessor a acusou porque ela fez críticas a seu trabalho.
Stephen Cooper, advogado de Baloga, diz que a idéia de que os homens não se importam em ser sexualmente molestados ou até gostam disso é um mito. Longe de se sentirem lisonjeados, eles se sentem "impotentes, usados e abusados", diz ele. "Quando os homens pensam em ser molestados, eles imaginam que é alguém como Brigitte Bardot que vai fazê-lo e que será divertido. As pessoas dizem a eles: 'Relaxe e goze!' Mas não é bem assim."
Ano passado, o gerente Sabino Gutierrez recebeu mais de US$ 1 milhão no processo por molestamento sexual que moveu contra Maria Martinez, diretora financeira da empresa Cal-Spas. Gutierrez contou que Martinez o importunou durante seis anos, exigindo que ele saísse com ela, que jantassem fora e mantivessem relações sexuais. Gutierrez foi despedido e ainda está desempregado. Martinez negou as acusações. A empresa apelou da decisão do tribunal.
Naomi Wolf afirma que, ao se distanciarem do papel de vítimas, as mulheres sentem a tentação de se vingar pelo tratamento que receberam dos homens. Ela aponta a forte reação feminina a filmes como "Thelma e Louise" e o caso de Lorena Bobbitt, jul
gada por decepar o pênis de seu marido depois de ter sido supostamente estuprada por ele. "Por muito tempo a sociedade enxergou as mulheres como a consciência moral da espécie humana", disse Wolf. "Mas isso era um mito."

Tradução de Clara Allain

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