São Paulo, segunda-feira, 7 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Plano FHC pode ser antídoto, diz Musa

ANTONIO CARLOS SEIDL
DA REPORTAGEM LOCAL

O programa de estabilização econômica do ministro Fernando Henrique Cardoso é "positivo" porque pode significar a descoberta de um antídoto para o "'veneno" que ameaça a vida da economia, as instituições e os aspectos morais e éticos do país.
A avaliação é Edson Vaz Musa, presidente da Rhodia, a maior empresa química do país (faturamento de US$ 960 milhões em 93). Ao se confirmar essa descoberta, o ministro Fernando Henrique Cardoso seria "um excelente" presidente, diz Musa.
Segundo Musa, a URV vai acabar com o processo de realimentação da inflação e manter o poder de compra dos salários em moeda forte. "Esse plano é uma coisa formidável", disse à Folha.
Depois de dizer que de nada adianta fazer um plano que tenha sucesso contra a "desgraça" da inflação "se não houver continuidade", Musa –"sou empresário e eleitor"– não escondeu o apoio do empresariado à candidatura FHC, dizendo que considera fundamental que "o país não saia do perigo para morrer na praia".
Quanto a Luiz Inácio Lula da Silva, virtual candidato do PT e líder das pesquisas de opinião sobre os potenciais candidatos à presidência, ele disse: "Respeito o Lula, mas nossas divergências ainda são grandes".
Ele vê de forma "positiva" o plano FHC, mas lamenta que o equilíbrio das contas públicas não tenha sido feito de forma mais "duradoura" no sentido da diminuição e melhor distribuição da carga tributária.
Musa, que se diz "otimista", afirma que tem esperança que a revisão constitucional faça as reformas fiscal e tributária para disciplinar e tornar mais eficazez os gastos públicos.
A seguir, principais trechos da entrevista:
Folha - Como o sr. avalia a fase URV do Plano FHC?
Edson Vaz Musa - De forma positiva. A inflação é um veneno para a economia, as instituições e aspectos morais e éticos do país. Nós já estavamos nos habituando com essa desgraça para o país, esse nível de inflação extremamente alto. Atacar e tentar resolver esse problema o mais rápido possível é fundamental. Um país industrializado como o Brasil não pode viver em uma situação dessa. Exceto a Rússia, o mundo inteiro já resolveu esse problema. O Brasil é um péssimo aluno, o último da classe.
Folha - Ainda dá para passar de ano?
Musa - Não vejo outra forma para isso do que primeiro resolver o problema do equilíbrio das contas públicas e depois quebrar a inércia inflacionária. O ministro Fernando Henrique Cardoso está neste caminho, embora teria ficado mais satisfeito se o equilíbrio das contas fosse mais permanente, mais duradouro, com a diminuição efetiva dos gastos em vez do aumento de impostos.
Folha - Isso pode prejudicar a eficácia do novo indexador, a URV, e sua transformação em moeda?
Musa - A minha preocupação é esta, mas temos que começar a combater a inflação. Vamos começar por aí e depois, numa outra etapa, se faz algo mais duradouro, no sentido mais correto que seria de diminuir a carga tributária e distribuir melhor essa carga tributária.
Folha - Quando seria essa etapa?
Musa - Na hora em que a inflação começar a dar sinais de ser controlada, esas coisas vão acontecer.
Folha - O sr. acredita que isso pode acontecer dentro da revisão constitucional com as reformas fiscal e tributária?
Musa - Como sou um otimista, continuo tendo esperanças que isso seja possível, porque é preciso disciplinar e tornar mais eficazes os gastos públicos no país. Mas talvez tenhamos que esperar algo de mais definitivo que venha com o próximo presidente.
Folha - A transição da URV para a nova moeda, o real, prescinde de uma ampla reforma na estrutura do Estado?
Musa - A transição com a URV para uma moeda forte é uma solução que me parece boa. É uma forma interessante de dolarização da economia.
Folha - O governo não admite que seja dolarização...
Musa - O governo não pode falar isso, mas nós podemos... Me parece uma forma correta para evitar aquele impacto brutal que teve na Argentina, porque o que não pode é quebrar o parque industrial brasileiro. Não podemos fazer a quebra da inércia inflacionária com uma valorização da moeda local como aconteceu em outros países, porque isso torna as exportações inviáveis e as importações ficam baratas, a incidência dos salários nos custos aumenta muito os preços. É preciso que esse plano seja monitorado de forma a impedir a valorização da moeda local.
Folha - Nesse sentido, o plano é recesivo ou expansionista?
Musa - Acho que vamos ter alguns meses que vão ser difíceis porque o governo tem que manter taxas de juros elevadas para o plano dar certo. Mas tenho esperança que lá por julho ou agosto veremos os primeiros resultados da queda da inflação e o deslanchar da economia.
Folha - Como o sr. analisa esse aumento preventivo de preços das últimas semanas provocados em grande parte pela expectativa dos agentes econômicos com o anúncio do plano?
Musa - A lei da oferta e procura é o único caminho para se resolver a questão dos preços. Se a batata dobrou de preço, a saída é parar de comprar batata para ela cair de preço. Quanto mais rápido o país conseguir formar uma noção de preços em moeda forte, mais rápido poderemos controlar essas distorções absurdas de preços.
Folha - Quando a Rhodia vai converter seus preços para a URV?
Musa - Já a partir desta segunda-feira. Todos os preços da indústria eram calculados em dólares. A indústria era obrigada a fazer no momento do faturamento uma suposição de qual seria a inflação e a variação cambial, mais uma margem de segurança, nos próximos trinta dias para que pudesse receber efetivamente o preço do produto. Com esse procedimento estavamos realimentando a inflação.
Folha - Como o sr. avalia as implicações da corrida eleitoral no gerenciamento do Plano FHC? Há risco de o plano "morrer na praia"?
Musa - Infelizmente temos esse componente importante no Plano FHC que é o aspecto político. É difícil separar as duas coisas. É perturbador. Ou o Fernando Henrique fica para gerenciar o plano ou sai para ser candidato à Presidência, deixando alguém afinado com ele e que mantenha a equipe econômica para monitorar o plano.
Folha - Qual seria a solução de agrado dos empresários?
Musa - Que se eleja em outubro e novembro um presidente afinado com a modernidade, com a internacionalização da economia, com a retomada do desenvolvimento. Não adianta nada a gente fazer um plano que tenha sucesso ou meio sucesso mas que depois não tenha continuidade. É fundamental ter um presidente liberal.
Folha - Fernando Henrique Cardoso?
Musa - Seria um excelente presidente.
Folha - Para o empresariado, FHC é o melhor nome antiLula?
Musa - Respeito o Lula, mas não concordo com ele. Em encontro recente de empresários com ele, do qual participei, ficou claro que nossas divergências são grandes. Não sou político, mas acho que Fernando Henrique é um bom nome para a presidência. Mas pode ser outro. O que acho fundamental é que o país não saia do perigo para depois morrer na praia.

Texto Anterior: Governo quer fechar acordo
Próximo Texto: Barelli chama 4 centrais para negociar salário
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.