São Paulo, segunda-feira, 14 de março de 1994
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Planta transgênica cria vírus mutantes

MARCELO LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

Os inimigos por princípio da biotecnologia vão vibrar com o trabalho de Richard Allison e Ann Green publicado sexta-feira na revista científica norte-americana "Science". A pesquisa do Departamento de Botânica e Patologia de Plantas da Universidade do Estado de Michigan (EUA) prova que genes introduzidos em plantas podem migrar espontaneamente para outros organismos do ambiente. Quando isso ainda era só hipótese, muita gente já advogava a paralisação desses experimentos.
O próprio Allison se diz totalmente favorável à engenharia genética de plantas. "Mas acho que nós, os cientistas, devemos proceder com cautela para assegurar que houve uma correta avaliação de riscos antes de esses organismos serem liberados no ambiente", disse à Folha por telefone. Sua pesquisa é financiada em parte pela Monsanto, multinacional que investe pesado em manipulação genética de plantas de interesse comercial.
O experimento de Allison foi descrito em outro artigo da "Science" como demonstração "clara e elegante" de que ocorre uma mistura (recombinação) de genes entre a planta Nicotiana benthamiana, aparentada com o tabaco, e um vírus (CCMV) que ataca o feijão-de-corda (veja desenho à direita). Os autores do comentário, Bryce Falk e George Bruening, da Universidade da Califórnia em Davis, consideram "residual" o risco de a recombinação engendrar vírus perigosos e "tola" a idéia de interromper pesquisas.
Genes contêm as instruções químicas para que um organismo seja fabricado. Allison e Green introduziram em 125 plantas 2/3 de um gene responsável por uma proteína fundamental do vírus CCMV, sem a qual ele não consegue espalhar-se pelo vegetal. Tentaram então infectar as plantas com uma versão de CCMV que tinha o 1/3 complementar do gene. Uma planta só poderia ser tomada pelo vírus, portanto, se houvesse intercâmbio de material genético para reconstituir o gene original –o que de fato aconteceu com 4 plantas (3,2%).
Falk e Bruening consideram improvável que essa recombinação se torne mais comum do que as que ocorrem naturalmente, entre vírus de uma mesma planta. Allison, 48, discorda: "As oportunidades de recombinação não são tão frequentes quanto em uma planta em que todas as células estão continuamente expressando uma parte do vírus".
Em um ponto, contudo, todos estão de acordo: os novos vírus vão ter de passar pela seleção natural e há uma probabilidade "diminuta" (Allison) de que eles se revelem viáveis e também patogênicos (capazes de provocar danos).

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