São Paulo, quarta-feira, 16 de março de 1994
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Hebe está certa?

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – O presidente da Câmara, Inocêncio de Oliveira, deu ontem por encerrado o "caso Hebe". Ele afirma que, na segunda-feira à noite, em seu programa, a apresentadora amenizou os ataques ao Congresso. Mas o caso não está encerrado. Sei que vou desagradar a um batalhão de leitores. Paciência.
A apresentadora tem razão em se indignar em relação à vagabundagem no Congresso. Vou até mais longe: receber sem trabalhar é ladroagem. E mais: considero seu sentimento sério enquanto reflexo do ânimo popular. Mas cuidado.
O Parlamento tem defeitos. Mas têm muitas qualidades –no mínimo, pelas CPIs que vêm produzindo. Apesar de todas as falhas, a CPI do Orçamento, por exemplo, foi um momento magistral e histórico de transparência no Congresso, expondo as entranhas de uma crônica roubalheira. Nenhuma categoria foi tão longe no Brasil.
Vamos ser honestos: a imprensa não exibiu esse nível de transparência. Será que os leitores conhecem, de fato, acordos feitos entre os poderes econômico e político e veículos de comunicação? Quantos jornais resistiriam à criação de um ombudsman independente?
Há pouco dias fiz colunas sobre a qualidade dos médicos. Como não quero cair no pecado corporativo, reconheço que, com frequência, vemos em nossa profissão mão-de-obra desqualificada, reflexo da crise educacional brasileira. Quantos jornalistas lêem mais de um livro por mês ou conhecem a história do Brasil? É muito mais fácil encontrar um jornalista à noite num bar do que estudando em casa.
A televisão nem de longe é exemplo de irretocabilidade. São raríssimos os programas com conteúdo pedagógico, o que demonstra a frágil conexão com o interesse público. Ao nivelar por baixo, as emissoras acabam estimulando, na prática, a ignorância, uma das razões para se explicar por que o Congresso tem tanta gente tão ruim.
PS – Para não ser injusto, há vários casos positivos a ressaltar na televisão. Alguns exemplos: os programas infantis da TV Cultura, a campanha da TV Globo pela criança e o "Jô Soares Onze e Meia". Gostaria, entretanto, de me fixar num nome: Boris Casoy. Ele é, hoje, o maior educador popular do Brasil e mostra como a televisão pode estar a serviço da democratização do saber.

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