São Paulo, quinta-feira, 17 de março de 1994
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D. Aloísio

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Uma das patetices do nosso tempo é dividir a Igreja entre progressistas e conservadores. Ela é, por definição e gosto, conservadora. Julga-se detentora de uma verdade, sofreu perseguições por causa da sua verdade e em nome de sua verdade também perseguiu. Ela se fixou na história como uma pedra, a pedra que nasceu do polêmico trocadilho: "Tu és Pedro e sobre esta pedra...".
Como instituição humana, adaptou-se aos tempos que atravessou. Mas foi e continua obrigada a "conservar" a sua essência que, segundo ela própria, é divina.
Daí a insatisfação dos católicos "progressistas" com o novo programa do PT. Em 1980, em sua primeira visita aos Estados Unidos, o atual papa, um polonês que podia ser considerado "progressista" numa comunidade ultraconservadora como a da ex-Cortina de Ferro, ficou chocado quando se reuniu com o clero de uma das maiores cidades americanas: dois sacerdotes se apresentaram, de mãos dadas, pedindo que o papa os casasse. Não é por nada não, mas depois disso, ficou difícil a Karol Wojtyla entender o Ocidente.
É católico quem quer e pode –aos 20 anos, quando questionei a estrutura eclesiástica e a própria religião, pedi meu boné e dei o fora. Ficar lá e cá, aproveitar-se da cobertura de uma instituição secular, gozar suas mordomias e negá-la em nome de valores políticos de circunstância, além de ser uma hipocrisia, é uma cretinice.
Faço a distinção para homenagear d. Aloísio Lorscheider, indevidamente rotulado de progressista por que luta pelos direitos humanos e combateu abertamente a ditadura. A diferença entre d. Aloísio e outros católicos progressistas é simples: ele não se vende à popularidade, ao oportunismo. Sabe distinguir na mensagem da sua Igreja o que é substância e acidente. Jamais sairia atrás da Mangueira para provar que não morreu.

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