São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
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Itamar recusa novo acordo e agrava crise

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Itamar Franco rejeitou ontem, pela terceira vez, um acordo que poria fim à crise aberta entre os três Poderes por causa da conversão dos salários em URV. O acordo costurado durante todo o dia, com a participação ativa do ministro Fernando Henrique Cardoso (Fazenda), foi acatado formalmente por representantes do Supremo Tribunal Federal, por lideranças no Congresso e pelo procurador-geral da República, Aristides Junqueira. Dependia apenas da aceitação de Itamar. No início da noite, o presidente disse "não".
Pelo sexto dia consecutivo, Brasília amanhece hoje mergulhada no impasse. Pelo acordo que havia sido costurado ontem, o governo não perderia nada. A conversão dos salários do Congresso e do STF seriam feitas pelo dia 30, sem o adicional de 10,94%, exatamente como desejava o governo.
Bastaria o governo reeditar a MP (medida provisória) que cria a URV (Unidade Real Valor) com modificações, deixando claro que os salários de todos os servidores teriam que ser convertidos pelo dia 30. A modificação funcionaria como admissão de erro do Executivo. O STF, que fez a conversão pelo dia 20, voltaria atrás em sua decisão –mas usaria o argumento de que agiu corretamente, que a falha era da MP original. Estaria preservada a autonomia do Judiciário e a situação se resolveria sem prejuízos.
Reunião
A proposta de acordo surgiu na manhã de ontem na casa do procurador-geral da República, Aristides Junqueira. Participaram os ministros Fernando Henrique Cardoso (Fazenda), Mário Cesar Flores (Assuntos Estratégicos), os ministros do STF Sepúlveda Pertence e Paulo Brossard, e os deputados Nelson Jobim (PMDB-RS), Sigmaringa Seixas (PSDB-DF) e José Genoíno (PT-SP).
As bases para o acordo surgiram de uma constatação básica: a crise poderia evoluir para um confronto institucional, ameaçando o funcionamento do regime democrático. Todos os presentes aceitaram a solução. FHC disse que era favorável também, mas dependia da decisão final do presidente da República.
A reunião na casa do procurador começou às 9h30, com a chegada de FHC. Logo depois, chegaram juntos Jobim, Flores e os dois ministros do Supremo, que haviam se encontrado mais cedo para discutir a situação. Em seguida, vieram os outros participantes.
Por volta das 19h, quando o Congresso já dava como certo o acordo, o ministro Fernando Henrique Cardoso anunciou que Itamar não aceitava a solução. Segundo o ministro, o governo vai esperar um pronunciamento do STF sobre a legalidade da conversão dos salário feita pelo dia 20. Não quis admitir que a MP estivesse errada.
Os desdobramentos da crise são imprevisíveis. Até agora, a conversão dos salários feita pelo STF teve como base um ato administrativo do Tribunal, desrespeitado pelo Executivo, que cortou os salários dos servidores. O ato administrativo pode se tornar decisão judicial, a partir de ações que foram impetradas ontem pelos sindicatos da categoria e podem resultar em liminares.
Nessa nova situação, ao invés de decisão meramente administrativa, o Executivo estaria desrespeitando uma decisão judicial. Um cenário de confronto aberto entre os poderes.

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