São Paulo, sábado, 26 de março de 1994
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A história e a grande conselheira

ROBERTO DE ABREU SODRÉ

Vivemos hoje no Brasil inexplicável crise: o confronto dos três Poderes. Razão: interpretação jurídica divergente, que envolve a remuneração dos servidores mais bem aquinhoados do país.
O Brasil está atento e carregado de preocupações. Chega-se a ouvir, entre maus patriotas, o murmurar: só nos salvaremos adotando o nefasto neologismo latino-americano –a fujimorização.
Esse pensamento me ocorre quando sou solicitado a escrever sobre a revolução de 1964. A causa que nos levou à revolução era gigante. Os atritos que hoje imobilizam todos os setores da administração, em Brasília, são pequenos.
A revolução nasceu como subproduto da criminosa e enlouquecida renuncia de Jânio. Sobe à Presidência o vice João Goulart. Este, aliado ao cunhado Leonel Brizola e a alguns líderes sindicais, marxistas ou saudosista do getulismo, agitavam toda a nação, com greves e bandeiras vermelhas.
Quebraram a hierarquia militar, dando força de comando ao cabo Anselmo e a fuzileiros navais do almirante Aragão. Marchávamos para o caos. Com o povo apoiando a intervenção militar, o governo ou desgoverno de Goulart se desmorona, sem tiro, sem herói.
Assumiu o poder um dos brasileiros mais eminentes que conheci, o marechal Castello Branco. Baixa reformas moralizadoras. A inflação cai, dando assim ao trabalhador mais que o "Pai dos Pobres" e seus afilhados proclamam.
Ao se aproximar o final de seu governo, começa o desvirtuamento dos ideais da revolução. Lembro, que como governador de São Paulo, sou chamado pelo presidente Castello, que solicita minha interferência junto ao meu amigo Carlos Lacerda para moderar seus ataques ao presidente. Já havia dois candidatos. Carlos Lacerda e JK.
Informava: se eu não tiver força para fazer um sucessor civil, eleito pelo povo, teremos uma ditadura militar por 20 anos. Profética previsão, via longe.
Com a posse de Costa e Silva, inicia-se minha dolorosa saga de contestador dentro do possível.
Promulgado o AI-5, escrevo ao presidente, como governador de São Paulo, em 18 de dezembro de 1968, dura carta condenando o ato revolucionário e oferecendo sugestões para um programa de governo democrático. A resposta não me foi dada. Passei a sofrer ameaças lideradas pelo inspirador do AI-5, ministro Gama e Silva.
A revolução de 64, que começou bem, terminou muito mal.
Pergunto: não é de se recordar esse passado tão recente? Não é de se temer, hoje diante da crise aberta, o pior? O presidente da República, o presidente do Supremo e os das duas Casas Legislativas precisam começar a dialogar, mas dialogar incessantemente, para devolver a paz tão necessária ao país.
Um pequeno benefício a poucos espalha-se por metástase a muitos, levando à morte o plano econômico tão necessário a todos.

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