São Paulo, domingo, 27 de março de 1994
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Ainda há como se divertir com a F-1

A emoção pode estar nos detalhes

MAURO TAGLIAFERRI
DA REPORTAGEM LOCAL

Não foi apenas uma chuva. Para muitos dos mecânicos e engenheiros da Jordan, o temporal que desabou sobre Interlagos ontem, exatamente no meio do último treino oficial, foi uma ducha de água fria.
Rubinho tinha dado umas poucas voltas na pista, com os pneus que usara de manhã, no treino livre. É uma estratégia das equipes, que acertam o carro com pneus velhos para, então, acelerar tudo com os novos. Tudo ia bem.
Só que teve um detalhe: na hora de deixar o box para buscar o melhor tempo, o carro não pegou. Já rezei para que meu carro pegasse, de manhã cedo, atrasado para algum compromisso. Mas nunca ouvi tantas preces para fazer pegar um único veículo. A família inteira do piloto, amigos, alguns mecânicos, até alguns bicões colaboraram.
Deu certo. O problema foi detectado e o motor funcionou. Por uns três segundos, houve alívio. Aí, despencou a chuvarada. Barrichello nem saiu do box. Deixou o carro morrer. Com a chuva, seria impossível melhorar seu tempo.
Mas, com certeza, para você que assistiu ao treino, aqui em Interlagos ou em casa, pela TV, a chuva foi uma bênção. Senna já disparava na frente e tudo iria acabar conforme o previsto. A chuva trouxe emoção ao circuito. Pilotos arriscaram dirigir debaixo d'água, houve as primeiras rodadas, o espetáculo ganhou cor, enfim.
E hoje tem mais. Muito mais. É o grande dia. A partir das 13h, começa a temporada de 94 da F-1. Você, com certeza, vai torcer. Seja lá pelo Senna, pelo Rubinho ou pelo Christian. Agora, se você é realmente um admirador das corridas, torça para que haja mais alguma emoção além da chuva de ontem.
Mas se o destino, ou São Pedro, não nos reservar nenhuma surpresa, tente prestar atenção aos detalhes da prova. Nesses dias em que trabalhei na Jordan, aprendi que também há vida e graça fora das pistas.
Fique atento ao pit stop. Com o reabastecimento, a vedete da temporada, as equipes tiveram de trocar o uniforme de seus mecânicos por macacões antifogo, luvas, máscaras e capacetes. Veja como os mecânicos se sentem desconfortáveis com essa parafernália.
Atente, ainda, para o perfeccionismo das equipes. O brilho, o lustro, o capricho fazem parte da rotina de trabalho de todos. "Isto é Fórmula 1", disse-me um colega de Jordan. Concordei.
Repare, também, na mania de limpeza de todo e qualquer ser humano envolvido na F-1. Sofri na pele essa quase obsessão pelo brilho, pelo lustro, pelo polimento.
Um mecânico da Jordan chegou ao preciosismo de estourar, uma a uma, com um canivete, as bolinhas de ar (visíveis só de muito perto, tem esse detalhe) que se formaram sob os adesivos do patrocinador da máquina de reabastecimento.
Olhe para os detalhes. Descubra um pouquinho deste mundo em que milésimos de segundo valem vitórias. Mas, se a TV não mostrar, eu conto para você amanhã. E com detalhes.

O repórter Mauro Tagliaferri está empregado na Jordan até hoje.

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