São Paulo, quinta-feira, 31 de março de 1994
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Dois cenários condicionam as decisões sobre o que fazer com o lucro da safra

GABRIEL J. DE CARVALHO
DA REDAÇÃO

Dois cenários condicionam as decisõessobre o que fazer com o lucro da safra
Para controlar consumo, juro deve ser alto na transição entre a URV e a nova moeda
A decisão dos agricultores sobre que destino darão ao lucro da safra está condicionada, este ano, ao desempenho do Plano FHC. Se caminhar razoavelmente bem, as aplicações de renda fixa e as Bolsas de Valores serão as alternativas mais vantajosas. Do contrário, a antecipação da compra de insumos (veja texto na página 19) e mesmo imóveis ou dólar surgiria como opção.
Ao introduzir a URV no dia-a-dia dos brasileiros, o plano econômico prepara a queda abrupta, porém não-traumática, da inflação. Com boa parte da economia urvizada, ou seja, contratos atrelados a este indexador, e os preços em cruzeiros reais evoluindo numa velocidade semelhante, a inflação desaba no momento da troca da moeda.
Em cruzeiros reais, a inflação corre a mais de 40% ao mês. Em URV ou dólar, zero ou 2%, 3%, na média ponderada de todos os preços. A aparente "mágica" do plano consiste, num determinado dia, em converter valores em URV para o real, sem a necessidade do congelamento.
A intenção é quebrar a inércia da inflação. O objetivo dos choques anteriores também era este, mas como houve congelamento, e de surpresa, muitas empresas e setores foram pegos no contrapé. Os preços relativos estavam muito desalinhados. As consequências foram o aparecimento do ágio, o desabastecimento e a volta revigorada da inflação.
No Plano FHC, há certo consenso de que a maior transparência das medidas facilitará a acomodação dos preços. Não há congelamento em URV ou na nova moeda. O programa foi cercado, também, de maior preocupação com o déficit público. Reformas estruturais, que devem vir mais à frente, consolidariam a estabilização.
A nova moeda deve ser garantida por reservas externas ou ações de grandes estatais reconhecidas internacionalmente. A quantidade de reais em circulação na economia sofrerá rígido controle por parte do BC. Daí a insistência do governo em equilibrar receitas e despesas do setor público antes de lançar a URV.
O real deve vir em junho ou julho, segundo os analistas. Há a promessa do governo de que o anúncio será feito com antecedência de 35 dias. Para que não haja explosão de demanda e especulação com estoques, o que abriria espaço para inflação na nova moeda, o Banco Central deve manter os juros bem altos. Fala-se no equivalente a 40% ou até 80% ao ano, pelo menos na fase inicial. A inflação alimenta a ilusão monetária e sua queda tende a esquentar o consumo.
É neste cenário de transição que os investidores em renda fixa sairiam ganhando, em comparação com outros que optaram por se endividar, formar estoques e antecipar a compra de bens.
As Bolsas ganhariam novo fôlego porque sairia o acordo da dívida, o país receberia o aval do FMI e haveria a entrada de mais investimentos estrangeiros. Este mercado está na dependência, também, da revisão constitucional e da corrida eleitoral.
Os analistas confiam mais neste cenário, mas não descartam a possibilidade de sérios tropeços do Plano FHC. Por exemplo, a inflação ressurgir relativamente alta na nova moeda –acima de 5% ao mês–, obrigando mexidas na taxa de câmbio. Os juros, obviamente, seriam puxados a um patamar bem superior ao previsto para inflação zero, mas as expectativas positivas sobre o plano cairiam por terra.
Este cenário econômico negativo influenciaria a corrida presidencial e, em princípio, passaria a favorecer os ativos reais, em detrimento da renda fixa e Bolsa.

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