São Paulo, sexta-feira, 1 de abril de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Dalton Trevisan publica seu 23º livro

MARCO CHIARETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

O escritor Dalton Trevisan, 69 anos, conhecido como o "vampiro de Curitiba", advogado, casado, duas filhas, leitor contumaz de "O Apanhador no Campo de Centeio" do norte-americano J.D. Salinger, autor de 22 livros, acaba de publicar "Ah, é?", que estará nas livrarias semana que vem. Reúne 187 pequenos textos, "ministórias", como diz o subtítulo.
É o próprio Trevisan quem melhor definiu seu novo livro, em uma espécie de auto-retrato composto há anos: "Há o preconceito de que depois do conto você deve escrever novela e afinal romance. Seu caminho será do conto para o soneto e para o haicai". Ele escreveu romance, "A Polaquinha" (de 1985). "Ah, é?" é o haicai.
Não há rima nestes 187 minúsculos contos. Mas a idéia de fulguração, de rápido clarão, contida no poema japonês, é o "Leitmotiv" da obra do escritor curitibano desde seu primeiro livro, "Novelas Nada Exemplares" (de 1959).
A concisão é a marca de sua prosa, assim como a discrição é o retrato de sua vida. Não dá entrevista, só fragmentos de conversa. Não se deixa retratar, não faz pose. É metódico, de poucos amigos, avesso a publicidade. Greta Garbo de Curitiba, segundo um amigo.
Em "Ah, é?" há novamente sexo, camas, velhas doentes, balas Zequinha, suor, mocinhas, "peninha", diminutivos, morte, memórias e perguntas. Na medida do possível, o livro é um dicionário da vida. Seus fragmentos são verbetes. Da alma.
Trevisan é um dos maiores escritores brasileiros. Um "vampiro sim, de almas", "espião de corações solitários", que suga o espírito de quem e do que o circunda. Seu mundo está em seus livros.
Sua arte está na precisão. Trevisan mais que vampiro é cirurgião. Corta obsessivamente a "gordura" das palavras. Deixa o essencial. O verbo. O princípio.
Repete-se? Nas aparências. A "ministória" 186, que diz o que é o escritor, um irmão –sobrevivente– de Caim e primo de Abel, aparece nos anos 70. Volta aqui. Com um "O" a mais. Passou anos reescrevendo a frase. Antes era: "Escritor é irmão de Caim e primo distante de Abel". Definiu-a.
"A chuva sovina conta e reconta suas moedas nas latas do quintal" ("ministória" 116). "Ah, é?" é um quintal cheio de latas.

Título: Ah, é?
Autor: Dalton Trevisan
Quanto: 9 URVs

Texto Anterior: "Depois do Amor" aprofunda as crises existenciais dos trinta anos
Próximo Texto: Isabelle Huppert edita revista de cinema
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.