São Paulo, quinta-feira, 7 de abril de 1994
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Betinho confessa

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Questionado pelo âncora do Jornal Bandeirantes, o santo Betinho disse que as novidades não devem afetar a campanha contra a fome. Para ele, a campanha não depende dele, mas de todos. Antes, em coletiva, reclamou e até atacou os que pensam que ele não comete erros. "As pessoas erram", disse, sem a segurança de antes, no Jornal da Record. "Umas mais, outras menos."
Tudo muito bem, até muito cristão. Como numa manchete do Jornal Nacional, que dizia: "Betinho confessa." Como no julgamento que Betinho fez de si mesmo, no TJ Brasil: "Se você assume o erro, ótimo." Ótimo, nada.
A campanha contra a miséria e a fome acabou. Afinal, já não tinha caráter efetivo. Era antes um movimento para implantar um espírito de cidadania, não para acabar com a miséria, uma ação que exige muito mais do que o assistencialismo formal. A campanha tinha um objetivo maior, que tomou o próprio Betinho como o seu símbolo, como a sua marca.
Como símbolo, ele não estava à altura. O fato é que Betinho recebeu dinheiro do jogo do bicho, o mesmo que mantém relações regulares com o cartel de Cali. Ontem, Betinho dizia não saber das ligações entre bicheiros e traficantes, o que já é brincar com a mentira. Por mais que o dinheiro tenha tido destinação nobre, a verdade é que ele teve origem ilegal, no mínimo ilegal.
E ainda falta explicar, como mostrou o TJ, a diferença entre o que registra a saída do jogo do bicho (US$ 85 mil) e a entrada na entidade de combate à Aids coordenada por Betinho (US$ 40 mil).
O governador Nilo Batista, o intermediário na doação dos bicheiros, foi outro que não deu maiores explicações. Disse apenas, no Jornal Bandeirantes: "Não recebi, não receberia nenhum auxílio para a minha campanha eleitoral." Outro que brinca com a mentira. Mas não é o que importa, quando se sabe que tanto o governador como o prefeito levavam dinheiro do jogo do bicho.
O âncora Boris Casoy mal quis falar de Betinho, guardando respeito, como todos os noticiários, mas não poupou a contaminação do Estado, através de Batista e do prefeito César Maia. "Este é o governo dentro do governo que se instalou no Rio." O mesmo governo-dentro-do-governo que garante as chacinas semanais, que podem ser acompanhadas todos os domingos, na televisão.

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