São Paulo, domingo, 10 de abril de 1994
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Cidade mais velha do país é campeã do cólera em SP

CLÁUDIA VARELLA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SÃO VICENTE

São Vicente, o município mais antigo do país –fundado em 1532–, se transformou no principal foco do cólera em São Paulo.
A cidade do litoral sul é campeã de casos da doença no Estado este ano. Até a última sexta-feira 16 pessoas haviam sido contaminadas. Três morreram. São Paulo já registrou 39 casos este ano.
A causa do problema é a falta de infra-estrutura sanitária. Segundo o SOS Saneamento, apenas 17% da população é servida por rede de esgoto. A doença ameaça 100 mil pessoas (30% da população).
Segundo a coordenadora da entidade, Edith Badini da Silva, 49, a cidade apresenta todos os pré-requisitos para o surgimento da doença: falta de saneamento nas casas e esgotos a céu aberto.
"A contaminação por via hídrica foi determinante para a propagação de doenças como cólera, verminoses e leptospirose", disse.
"Não podemos continuar vivendo dentro de um enorme esgoto a céu aberto. A questão é de vida ou morte", diz o prefeito Luiz Carlos Luca Pedro (PT), 39.
O superintendente regional da Sabesp na Baixada Santista, João Paulo Tavares Papa, 35, afirmou que 46% dos imóveis de São Vicente têm rede de esgoto.
Segundo ele, todas as casas de veraneio têm água e esgoto. O fornecimento de água atingiria 96% das casas de moradores da cidade. Papa diz que três obras em andamento (orçadas em US$ 7,5 milhões) devem melhorar a rede.
A Secretaria Municipal de Saúde instalou 33 caixas de cloração nos 19 canais da cidade para conter o avanço do vibrião do cólera nas áreas onde não há saneamento.
A pesca e a retirada de frutos do mar nas pontes dos Barreiros e do Mar Pequeno –locais considerados de risco pela Vigilância Sanitária– são desaconselhadas.
"Ainda não é necessária a proibição", disse Reis. Ele afirmou que espera liberação do Ministério de Saúde de CR$ 50 milhões para programas de combate à doença.
José Aparecido Soares, 37, que pescava quinta-feira passada na Ponte dos Barreiros, disse não ter medo de contrair o vibrião. "Se fritar o peixe a 70 graus por 20 minutos o vibrião morre", disse.
José Pascoal da Silva, 62, disse que há um mês teve diarréia e ficou internado. "Comi muito marisco, mas acho que a desinteria foi por causa de um frango."
"Bem fritinho, o micróbio da cólera não pode viver,", disse Pedro Valentim, 75, que pescava quinta-feira à tarde. Ele não acredita que possa contrair a doença.
No bairro Esplanada dos Barreiros, José Rodovalho, 67, também disse não temer o vibrião: "Como 20 ostras de uma só vez".
Segundo Gilmar Pascoal da Silva, 35, a venda de ostras diminuiu com a divulgação do cólera. "Antes, vendia dez dúzias por dia. Hoje, vendo no máximo quatro."
O desempregado José Carlos da Silva, 35, mora com três adultos e três crianças numa casa de alvenaria de dois cômodos, na favela Sá Catarina de Moraes.
Ele, o irmão José Roberto, 29, e o sobrinho Márcio Silva, 16, contraíram cólera. José Roberto morreu. Foram os primeiros casos confirmados neste ano na cidade.
A vigilância informou que José Roberto foi considerado "caso compatível", isto é, a doença foi constatada devido aos sintomas, mas não foram feitos exames.
José Carlos diz que ficou doente em março, depois de comer peixada na ponte dos Barreiros. "Comi siri e marisco. Meus irmãos também. Todos ficaram doentes."
O outro irmão, Gélson, 31, morreu em março com sintomas da doença. Oficialmente, o caso não é de cólera. A vigilância aguarda resultado do Instituto Médico Legal.

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