São Paulo, quarta-feira, 13 de abril de 1994
Texto Anterior | Índice

Qual é o plano?

ANTONIO DELFIM NETTO

Quando as paixões se acalmarem e não "soubermos se deve prevalecer o riso ou a piedade" (como disse o poeta preferido de nosso ministro da Fazenda), acabaremos reconhecendo que, com todos os seus erros e desmandos, o governo Collor iniciou um novo regime fiscal. O fato não é facilmente visível porque a reforma monetária fracassou e as taxas de inflação espantosas têm levado uma multidão de economistas a confundirem a nuvem com Juno.
Os últimos números disponíveis mostram o seguinte:

Esses números revelam que desde 1990 o ajuste fiscal estava praticamente feito. A média do desequilíbrio fiscal no setor público consolidado no período 1990/1993 foi nula, variando de um superávit de 1,33 em 1990 para um déficit de 1,59 em 1992, com 1993 voltando ao equilíbrio conseguido em 1991. Como temos dito muitas vezes nesta coluna, são quatro anos sem déficit operacional, mas com as maiores taxas de inflação do mundo!
Esses números são um conforto, mas mostram que o equilíbrio fiscal é apenas condição necessária para o sucesso de um programa de estabilização duradoura. Em 1986, no Plano Cruzado, houve um formidável engajamento popular, difícil de reproduzir agora. O programa fracassou por alguns erros implícitos e, principalmente, porque o déficit operacional naquele ano foi de 3,6% do PIB. Queimaram-se as precárias reservas de divisas importando queijo suíço e tampinhas de cerveja, e a crise cambial produzida por uma aposta no congelamento cambial com déficit orçamentário estuporou o plano.
Em 1990, o programa Collor 1, com toda a sua truculência, produziu um superávit fiscal da ordem de 1,33% do PIB. Mesmo com o câmbio congelado, durante alguns meses não conseguiu reduzir a inflação a patamares que garantissem a sua continuidade.
Em 1994 estamos fazendo outra experiência: o governo arrancou do Congresso acovardado um cavalar aumento de impostos, que deve produzir um superávit primário superior a 4% do PIB. As reservas estão nos píncaros (e o seu custo social também!). A introdução da engenhosa URV manteve sob controle as reivindicações salariais e com um pouco de tempo deve produzir um realinhamento de preços.
Todas as medidas preventivas e preparatórias de um programa de estabilização parecem estar funcionando. Mas é isso garantia de sucesso? De que plano estamos falando, afinal? Não existe plano de estabilização ainda. Ele só existirá, e então será possível especular se ele funcionará, quando forem definidos o regime monetário e o regime cambial da nova moeda, e o que faremos da dívida interna.
Não devemos esquecer que o problema do Brasil é reinventar a moeda e construir mecanismos institucionais que garantam o controle exógeno de sua oferta. Sem isso, a inflação vai, mas volta!

Texto Anterior: Caras e caras
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.