São Paulo, quinta-feira, 14 de abril de 1994
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"Macaco Louco" mostra vítimas do desejo

MARCELO REZENDE
DA REDAÇÃO

O filme "O Sonho do Macaco Louco", do diretor espanhol Fernado Trueba parece, em um primeiro momento, uma sucessão interminável de clichês.
Tudo converge para uma história já contada, para um filme já visto. Mais isso, de alguma forma, é um engano.
A habilidade de Trueba é oferecer uma perspectiva enviesada sobre imagens –e enredos– aparentemente gastos.
A história, baseada no romance do inglês Chistopher Frank, mostra um momento na vida do escritor Dan Gillis (Jeff Goldblum).
Gillis é um americano que vive em Paris e tem a sua vida transformada no dia em que sua mulher resolve abandoná-lo. O escritor é obrigado a cuidar do filho do casal, uma criança de cinco anos.
Se a história, logo em seu início, nos leva a pensar em mais um homem afetado pela desordem amorosa, o que na verdade se mostra é o contrário.
Esse homem, abandonado e com um filho, se sente –ainda que no início não se dê conta– livre. Uma liberdade que significa ir de encontro as suas próprias obsessões.
O escritor passa a conviver com uma obsessão sexual que não se explica, um desejo que corrompe. Apenas se mostra quando Gillis resolve aceitar o conselho de sua agente (Miranda Richardson) e escrever um roteiro para um cineasta iniciante.
O que vem em seguida é sua vida transformada em vertigem. Transtornado pela irmã de 16 anos do jovem diretor, passa seus dias obcecado por ela. Até que tudo acaba ruindo.
Dessa história que no final acabará se mostrando tão perversa, só sabemos aquilo que esse homem sabe. Ou melhor, vemos os fatos pelo ponto de vista de vítima, papel no qual ele se coloca. Como se o mundo conspirasse para levá-lo à loucura.
Exatamente como o conquistador manipulado pelas mulheres no outro filme do diretor, "Sedução", que acabou dando a Trueba o Oscar de melhor filme estrangeiro desse ano.
Nos dois filems, Trueba constrói persoangens que vivem movidos por uma idéia a ser realizada. Nos dois casos, há o desejo quase doentio por uma mulher. Ou por mulheres.
Mas, se em "Sedução" tudo era corria divertidamente em tom de farsa, como se não houvesse qualquer consequência nos atos, em "O Sonho do Macaco Louco" Trueba aceita a tarefa de mostrar o que há de mais sombrio na arte de seduzir. O que se esconde na situação de desviar alguém de uma trajetória já traçada.
Troca uma ensolarada Espanha por uma Paris suja e invernal. Existe uma intenção em dessacralizar imagems. Trueba coloca seus personagens em situações em que não há prazer.
Nesse seu filme, que carrega ainda muitas imperfeições (como se sofresse de uma afetação na maneira que é filmado), não existe mais qualquer perspectiva de felicidade no desejo.

Filme: "O Sonho do Macaco Louco"
Produção: Inglaterra, França e Espanha, 1993
Direção: Fernando Trueba
Elenco: Jeff Goldblum e Miranda Richardson
Distribuição: Paris Vídeo Filmes (011/864-3155)

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