São Paulo, quinta-feira, 14 de abril de 1994
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"Irmãos Krays" cria fetiche do mal

BERNARDO CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Num filme como "Os Implacáveis Krays" (1992), do inglês Peter Medak (responsável pelo "cult" recente "Romeo is Bleeding", ainda inédito no Brasil), nunca se sabe se é de propósito ou não.
O cineasta já havia feito uma comédia em que o filho de um lorde inglês acreditava ser Jesus Cristo ("The Ruling Class", 1972) e uma paródia pederasta do cavaleiro mascarado ("Zorro the Gay Blade", 1981).
Pelos antecedentes, tudo leva a crer que é para rir, mas "Os Implacáveis Krays" não tem a menor graça.
Baseado em fatos verídicos (mas dando-lhes um enfoque inverossímil), o filme conta o percurso violento de dois gêmeos sanguinários de um típico bairro operário de Londres à liderança de uma gangue no submundo do crime.
Na verdade, o enfoque que Medak dá à história dos irmãos Kray é muito mais fetichista e romântico do que psicológico. Há, desde o início, a tentativa de uma explicação de cunho "mítico" (mais que social ou psíquico) para a orgiem do mal, encarnado no sadismo dos dois protagonistas.
Feminismo camuflado
A fetichização já é bastante caricata, mas ainda fica aquém da caricatura de um discurso corporativista das mulheres, que perpassa todo o filme. Nisso há uma certa misoginia, tão mais curiosa por vir camuflada de feminismo.
Os malvados Kray (um deles não podia deixar de ser gay, para reforçar os clichês da mitologia sobre gêmeos) são criados dentro de um universo de mulheres fortes, que comandam a casa e dominam o pai apático e frouxo.
Aparentemente (há inclusive um grotesco discurso feminista sobre o sofrimento das mulheres parindo durante a guerra) tudo é a favor do mundo feminino. Mas, ao mesmo tempo, são elas, como na tradição do "film noir", do cinema policial americano, que trazem o mal em si: não é menos grotesco o discurso da mãe narrando que teve um sonho em que era um cisne e tinha um ovo, logo antes de dar à luz os gêmeos do mal.
É difícil entender se a perspectiva é irônica, se tudo é apenas paródia, porque o constrangimento ofusca qualquer outra percepção.

Vídeo: Os Implacáveis Krays
Diretor: Peter Medak
Elenco: Gary e Martin Kemp
Distribuidora: Paris Vídeo Filmes (011/864-3155)

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