São Paulo, sábado, 16 de abril de 1994
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Risco real

As modificações aprovadas pela comissão encarregada de avaliar a MP 457, que cria a URV, não alteram em essência o plano de estabilização. Mesmo assim, afetam as expectativas sobre o futuro da política econômica, ainda que não por seu impacto imediato, que é reduzido, mas pelas pressões que anunciam.
A suposta reposição de perdas salariais que ocorram entre março e junho, portanto após a conversão pela média, não terá qualquer efeito prático. Mas a criação de um índice para calcular a inflação em real e, principalmente, a possibilidade de que, por decreto presidencial, tal índice venha a corrigir salários e contratos trazem a perspectiva de reindexação na nova moeda.
Ainda que tecnicamente a volta dos instrumentos de correção não seja uma fatalidade, não se pode subestimar as pressões que ocorrerão nesse sentido. Em favor dessas pressões está a longa e infelizmente arraigada cultura inflacionária. Está também a tradição paternalista, que espera do Estado a solução de todos os conflitos e dificuldades.
Além dessas razões, por assim dizer, históricas, há fortes motivos conjunturais. A proximidade das eleições tende a fazer crescer o caráter político do debate econômico nos meses vindouros.
O fato de que o segundo colocado nas pesquisas é exatamente o responsável pela elaboração do plano ressalta o impacto do quadro eleitoral.
Por um lado, o crescimento da candidatura de Fernando Henrique Cardoso tende a trazer apoio também ao plano de estabilização. Mas também fará com que as forças de oposição ao ex-ministro percebam a conveniência eleitoral, além de possíveis convicções reais, de atacar as medidas econômicas.
Somando-se ao efeito dessas perspectivas, o lamentável fracasso da revisão constitucional, dado como quase certo, vem obscurecer o horizonte de médio e longo prazos. As reformas estruturais necessárias a um equilíbrio consistente das contas públicas e à modernização do quadro institucional e econômico parecem novamente adiadas.
O país não se confronta com uma batalha perdida, mas há de se reconhecer que, como era previsível, será preciso mais do que um malabarismo técnico para acabar definitvamente com a inflação.

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