São Paulo, domingo, 17 de abril de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Gerdau culpa elite política pelo fracasso da revisão

ANTONIO CARLOS SEIDL

Gerdau culpa elite políticapelo fracasso da revisão
Para o empresário, houve 'irresponsabilidade' dos congressistas

Jorge Gerdau Johannpeter, 57, coordenador da ação empresarial pró-revisão constitucional, culpa a "irresponsabilidade" da elite política pelo fracasso da revisão.
Gerdau dirige um dos maiores grupos de siderurgia do país. O grupo Gerdau, do Rio Grande do Sul, tem um faturamento de US$ 1,2 bilhão por ano.
Ele acusa os políticos de estarem perdendo uma "oportunidade histórica" para tirar o país da estagnação.
Apesar da falta de avanço da revisão, Gerdau diz que a ação empresarial teve um "sucesso fantástico". Para ele, o país é hoje muito diferente do que era antes do início do Congresso revisor.
Folha - Por que a revisão corre o risco de ser encerrada já?
Jorge Gerdau Johannpeter - Para mim ela ainda não acabou, porque o ministro Rubens Ricupero sabe que tem que conseguir a aprovação de uma agenda mínima com alguns pontos vitais para o sucesso do plano de estabilização.
Folha - Como o sr. avalia a chance de sucesso de mais uma tentativa de acordo com os partidos contrários à revisão para votar uma agenda mínima até 31 de maio?
Gerdau - Tenho esperança de que essa tentativa não fracasse como as anteriores. Mas temo nova omissão dos congressistas.
O eventual fracasso da revisão é o resultado de um enorme gesto de irresponsabilidade da elite política.
Folha - Por quê?
Gerdau - O ano eleitoral é um fator decisivo que impede o avanço da revisão. Pesquisas mostram que de 65% a 75% dos congressistas concordam que a revisão é necessária.
Mas como querem se reeleger, eles preferem não tomar posicionamentos antes das eleições.
Folha - Em vista disso, uma agenda mínima, se for conseguida, não seria inconsequente e demagógica?
Gerdau - A pauta mínima não dá realmente as condições ideais para a necessidade de saneamento das finanças do país e da geração de empregos.
Mas é evidente que um passo a mais, ainda que pequeno, ajuda. Mas o Brasil nesse momento mereceria mais.
Folha - Como o sr. avalia a proposta do relator da revisão, deputado Nelson Jobim (PMDB-RS), de encerrar logo a revisão porque não vê empenho do governo em apresentar soluções para a reforma tributária?
Gerdau - Concordo com ele de que a omissão do Executivo é uma peça-chave no processo de fracasso da revisão.
Além disso, a Receita Federal tem uma visão eminentemente fiscalista, entendendo que o sistema atual está bom porque ela está conseguindo arrecadar mais.
A Receita ignora a visão social, política e econômica dos sistemas tributários modernos que objetivam o aumento das exportações e a geração de empregos.
Folha - Os empresários têm alguma sugestão para uma reforma tributária dentro do pouco tempo que resta para salvar a revisão constitucional?
Gerdau - A negociação de uma lei tributária correta necessita de um longo debate. Por isso, surgiu uma idéia que eventualmente possa evitar esse debate prolongado, que é a desconstitucionalização.
Se quizermos salvar a revisão, deve-se buscar alguns objetivos de desconstitucionalização da Previdência e da reforma tributária.
Folha - Como isso funcionaria na prática?
Gerdau - Seria simplesmente o resultado de um acordo para passar para leis ordinárias a discussão da Previdência Social e da reforma tributária. A Constituição, aliás, deveria ser apenas de princípios e de regras gerais, o que evitaria o tumulto que hoje vivemos.
A desconstitucionalização é o caminho para que os próximos governos tenham condições de gerenciar o país.
Folha - Diante das dificuldades para um acordo que garanta a continuação da revisão, o sr. considera que o movimento empresarial pró-revisão fracassou?
Gerdau - Ao contrário de fracassar, a ação empresarial teve um sucesso fantástico.
Folha - Por que?
Gerdau - Porque deu unidade ao posicionamento do empresariado e levou essa unidade claramente aos congressistas.
O empresariado teria fracassado se não tivesse levado ao Executivo e ao Legislativo sua visão clara, limpa e sem interesse de defender posições individuais.
O empresariado cumpriu com sua missão. Quem falhou foram os congressistas que estão lá para fazer a revisão e não cumpriram com uma obrigação.
Folha - Os empresários vão adotar uma posição de revanche contra os congressistas neste ano eleitoral?
Gerdau - Os empresários não têm posição de revanche porque isso é um problema de consciência individual. Não haverá ação coletiva dos empresários contra os políticos.
O empresariado está com a consciência tranquila. Esse movimento deu uma posição impar ao empresariado.
Os empresários abriram mão de posições históricas, eventualmente visando sua proteção, para construir e defender idéias exclusivamente de interesse coletivo para o desenvolvimento global.
Folha - Quais são as implicações que o encerramento da revisão traz para a economia?
Gerdau - As piores implicações são relacionadas com a perda de competitividade do país. Se o país mantiver essa legislação tributária obsoleta e um sistema estrutural quinze anos atrasado vai ter que se contentar com um crescimento extremamente pequeno.
O sistema político continuará perturbado porque vamos ter um processo eleitoral complexo por causa da diversidade de partidos, da não fidelidade partidária e da inexistência do voto distrital que vincule o eleitor ao político.
A impossibilidade da captação de capitais estrangeiros em igualdade de condições com os países competidores é um fator de limitação da confiança externa no país.
O não rompimento dos monopólios das telecomunicações e do petróleo vai fazer com que es empresas estatais desses setores continuem acomodadas.
As implicações mais sérias da falta de correções estruturais mais profundas através da revisão constitucional são uma economia estagnada sem geração de empregos e dentro de um processo lento de crescimento.

Texto Anterior: O escândalo se ilumina
Próximo Texto: Monopólio será debatido
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.