São Paulo, domingo, 17 de abril de 1994
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Torcedor, aproveite enquanto há tempo

ALBERTO HELENA JR.

O futebol vai se transformando em uma gigantesca feira de negócios a cada reeleição na Fifa de Havelange

Palmeiras e São Paulo correm atrás do título paulista, com um olho no Corinthians, outro na Libertadores e o terceiro (aquele mesmo, dos hindus) na seleção que lhes suga o mais doce mel.
No campeonato, jogam de dois em dois dias. O Palmeiras ainda mantém acesa a chama de sua torcida, que comparece com frequência aos estádios. Mas o São Paulo, ainda por cima, tem de aturar a 'Coréia', aquela meia-dúzia de insatisfeitos que vaia o time até quando faz gols.
Por isso, é obrigado a encaixar à força alguns amistosos, como o disputado lá na Ásia, para juntar uns tostões que cubram suas despesas milionárias.
Sim, porque se o Palestra tem a Parmalat de escudo; o tricolor, não. Mas ambos mantêm equipes caríssimas. Não me refiro apenas aos salários dos jogadores. Mas à toda a infra-estrutura do futebol, que vai dos equipamentos sofisticados de avaliação física à nutricionista e tudo o mais.
Isso tudo pra jogar diante de 3.000 pessoas. Não dá pra pagar o palito que Telê mastiga sem parar durante os jogos.
Hoje, tem clássico no Morumbi. Só a presença de Cafu, por exemplo, bastaria para encher qualquer estádio da Europa. Mas o tricolor, bicampeão do mundo, disputando o título paulista, cabeça a cabeça com seus mais tradicionais rivais, Palmeiras e Corinthians, se atrair 15 mil espectadores será um milagre.
Dobre a aposta para o Palmeiras, que pega o América e a situação é a mesma. O pior é que não há uma luz no fim do túnel. Ao contrário: lá, persiste a mais negra escuridão. Eterna escuridão.
Sim, porque com os Teixeiras e Farahs, e seus sucedâneos, nada mudará. Mesmo porque eles se espelham em Havelange, o mais bem-sucedido de todos os cartolas gerados por esta infeliz Terra de Santa Cruz, santa cruz!
Depois de ter dado o sinal para que o Campeonato Nacional se transformasse numa quermesse eleitoral, há quase um quarto de século, Havelange empalmou a Fifa e, a cada vitória sua nas urnas, mais a Copa do Mundo se transforma numa gigantesca feira de negócios. E quanto maior a feira, mais vagabundo o produto exposto nas bancas.
Portanto, é bom o torcedor correr agora aos estádios, pois daqui a pouco nada mais terá de novo pra ver.

Luiz Ernesto Kawals, do Sindicato da Micro e Pequena Indústria, me manda um fax reclamando da estátua de Leônidas da Silva no Memorial Tricolor. Elogia o empreendimento, mas detecta um erro histórico: Leônidas, na figuração, está completando sua bicicleta com o pé esquerdo. Kawals assegura que o Diamante Negro finalizava o lance com o direito.
Pode ser. Mas lembro-me que, em 74, na Copa da Alemanha, ficamos no mesmo hotel, na Floresta Negra. E levavamos longos papos. Num deles, perguntei a Leônidas se ele tinha preferência pelo lado de lançamento da bola.
Ele me garantiu que não. Podia vir da direita ou da esquerda, era indiferente. Assim, como lhe era indiferente com que pé culminasse a jogada inventada por Petronilho de Britto.

Tostão coloca o jovem centroavante Ronaldo, do Cruzeiro, lá no céu. Pois é onde Zagalo quer vê-lo, quando diz que, para a quarta vaga do ataque da seleção, até agora ocupado por Bebeto, Romário e Muller, é preciso considerar um cabeceador emérito. É fato.
Mas o mundo dá tantas voltas que acabaremos no Tostão esta pequena parábola: em 70, Zagalo queria um cabeceador, um centroavante forte, veloz e resistente. Jogou Tostão, meio metro de altura e proibido de cabecear qualquer bola, por expressa ordem médica. Fomos campeões, lembram-se?

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