São Paulo, quarta-feira, de dezembro de
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Safra perdida

MARCELO BERABA

SÃO PAULO – A ação da chamada bancada ruralista no Congresso é um escândalo. Ela conseguiu impedir que o plano de estabilização econômica criado pelo governo fosse aprovado.
Os deputados, pretensos defensores dos ruralistas, não impediram a votação por que são contra a política econômica do governo ou por que acham que o plano é um estelionato eleitoral ou por que têm uma proposta melhor para o país.
Eles impediram a votação para forçar o governo a renegociar a dívida que têm com os bancos oficiais. Razões, portanto, que supõem nobres e patrióticas.
O Congresso é por definição o espaço que o sistema democrático destinou aos embates entre interesses conflitantes.
É legítimo, portanto, que os ruralistas exponham seus interesses e se utilizem dos instrumentos do Congresso. Mas não há legitimidade no jogo de chantagem que ocorreu.
Alguns produtores devem a bancos oficiais. Se não pagarem, a Justiça julga. Se acham errado, devem tentar mudar a lei. Se tiverem maioria, mudam. Se não, pagam. É um jogo simples.
Chamei os deputados de pretensos defensores dos ruralistas e justifico com a repercussão colhida pela Folha entre empresários rurais de peso. Quase todos condenaram a ação do grupo.
Uma informação que mostra o tamanho do escândalo: de 5 milhões de produtores rurais, apenas 18 mil são inadiplentes. Anistiá-los, portanto, significa punir os que cumprem suas obrigações.
Ao subjugar o Congresso com a ajuda oportunista dos partidos de esquerda, a "bancada ruralista" expôs, pela enésima vez este ano, a fragilidade do nosso sistema político.
Não são eles, os "ruralistas", que estão fortes. O sistema é que está fraco. Os partidos estão fragmentados e acéfalos no Congresso. As corporações assumiram o papel de verdadeiros partidos.
Os interesses localizados –sejam de grupos conservadores, como os ruralistas, sejam de setores que se imaginam de esquerda, como o sindicalismo estatal– não passam pelos partidos.
Por estas e outras razões –como a distorção na representação dos Estados– o Congresso não tem conseguido cumprir o papel de defensor e legitimador dos interesses das maiorias.

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