São Paulo, quarta-feira, 4 de maio de 1994
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Estudo faz radiografia da pesquisa industrial

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O futuro presidente brasileiro vai ter à disposição um estudo de mais de 6.000 páginas sobre o estado atual da indústria no país e do papel que a ciência e tecnologia podem ter para tornar o setor mais competitivo internacionalmente.
"Não é um plano de governo, são subsídios para uma política industrial", diz o coordenador do estudo, Luciano Coutinho.
O estudo foi tema de debate ontem no Seminário Internacional de Avaliação e Propostas para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o Brasil, que termina hoje na Fundação Getúlio Vargas.
O que se fizer com os resultados, e o modo como as políticas serão implementadas, "vai depender do gosto do freguês", afirma Coutinho, economista e professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
O estudo foi encomendado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e custou US$ 1,6 milhão. Foram analisados 34 setores industriais.
Há recomendações no estudo para o governo, às empresas privadas, aos trabalhadores e à comunidade acadêmica.
Um dos problemas mais salientes é o baixo investimento do setor privado em pesquisa e desenvolvimento.
Coutinho elogia as atuais iniciativas do Ministério da Ciência e Tecnologia em criar incentivos legais para as empresas investirem em pesquisa, recebendo em troca deduções e isenções fiscais.
"São projetos bons para a média empresa, mas não ajudam as empresas que precisam de alta tecnologia", diz ele.
Uma empresa dessas gasta geralmente mais de 5% de seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento. Em certas áreas, esse percentual pode passar de 15%.
O estudo mostra áreas da indústria competitivas internacionalmente, mas nas quais algum impacto de ciência e tecnologia melhoraria ainda mais a inserção internacional, como as agroindústrias da soja e da laranja, a avicultura avançada, as indústrias de papel e alumínio etc.
Entre as áreas com problemas maiores estão as indústrias de calçados, têxtil, de móveis, metal-mecânica, de materiais de construção etc.
O meio pelo qual fazer esse "choque de competitividade" é o que pode provocar polêmica.
Entre os riscos de projetos que privilegiam a inovação tecnológica estão a maior concentração de renda e o desemprego, segundo um dos debatedores, Paulo Paixão, presidente do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).
Paixão teme por políticas "excludentes", que ignorariam as enormes desigualdades na sociedade brasileira.
Uma das respostas para a questão poderia ser um maior investimento em educação (leia texto à esquerda).
Um dos representantes do Banco Mundial presentes, Geoffrey Shepherd, falando em seu nome, disse que duvida da capacidade do Estado brasileiro de administrar o tipo de política que o estudo apresentado demanda.
Não foi o único: uma reforma do Estado foi considerada necessária por boa parte dos participantes do debate.
Comentando a pesquisa, o argentino Daniel Chudnovsky, da Universidade de Buenos Aires, afirmou que a América Latina é um "terreno fértil" para esse tipo de estudo.
Outros países fizeram políticas de estabilização econômica antes, e com mais sucesso que o Brasil. Mas nenhum deles têm uma base industrial que permita com tanto potencial um salto qualitativo e competitivo.

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