São Paulo, sexta-feira, 6 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

'Na F-1, essência do esporte já terminou'

PAULO FERRAZ
DA REPORTAGEM LOCAL

`Na F-1, essência do esporte já terminou'
O piloto Emerson Fittipaldi, atualmente na Fórmula Indy, acusou ontem os dirigentes da Fórmula 1 de não permitirem que os pilotos participem das decisões sobre a segurança da temporada.
Emerson foi quem mais se emocionou durante o velório de Ayrton Senna, ontem.
Ele veio dos Estados Unidos com sua mulher Tereza. Desembarcou em Cumbica à 1h e às 4h05 chegou ao velório.
Emerson entrou mas, a princípio, não teve coragem de se aproximar do caixão. Ficou olhando à distância e chorou. Só às 4h35 é que ele se aproximou com Tereza.
Uma hora mais tarde, às 5h35, Emerson saiu para acompanhar sua mulher até o carro. Na volta, ele deu entrevista à Folha. A seguir, os principais trechos.

Folha - Você acha que os acidentes em Imola servem como um alerta aos dirigentes da F-1 com relação à segurança?
Emerson Fittipaldi - Eu acho que os acidentes fatais que aconteceram com o Ayrton e com o piloto austríaco mostraram que alguma coisa tem que ser feita na Fórmula 1. Em termos de pistas, de carros, enfim, um pouco de tudo.
Folha - No seu tempo de F-1, os pilotos pareciam ser mais unidos, principalmente no que se refere à segurança. Você acha que hoje isso já não existe mais?
Emerson - Eu acho que hoje há um controle muito grande da FIA (entidade maior do automobilismo), do Bernie Ecclestone, tirando totalmente a força dos pilotos.
Eles tentam enfraquecer e desunir os pilotos. Na F-1, a essência do esporte já terminou.
Folha - Como é o relacionamento entre os pilotos, as equipes e os dirigentes da F-1?
Emerson - É um sistema ditatorial. São eles que ditam as regras e ponto final.
Folha - Você acredita que as barreiras impostas contra a participação dos pilotos nas decisões podem ser vencidas?
Emerson - Eu acho que todos têm que se unir. Em vez de ficar brigando com os pilotos, eles deveriam tentar fazer alguma coisa para melhorar a segurança.
Folha - E como tio, que conselhos você tem dado ao Christian depois desses acidentes todos?
Emerson - A gente sabe que o automobilismo é um esporte de alto risco. O Christian tem que manter a cabeça fria e tentar lutar, como piloto, para a melhoria da segurança. Reclamar e não fazer nada não funciona.
Folha - Parar não adianta?
Emerson - Não. Eu sei que a morte do Ayrton abalou todo mundo. Na segunda-feira à noite, o George Harrison (ex-integrante dos Beatles) me ligou da Austrália e disse: "Ayrton for me was invencible" (Ayrton para mim era invencível).
Ele disse isso nos dois sentidos: invencível na pista e na vida. Mas isso não deve interromper a carreira de ninguém.
Folha - Você se recusou uma vez a participar de uma prova de F-1 por falta de segurança, não foi?
Emerson - Foi aí que começou a minha grande decepção com os dirigentes da Fórmula 1. Foi em 1975, no GP da Espanha, em Montjuich.
Durante os treinos, percebi que os guard-rails estavam completamente soltos, alguns amarrados com arames.
Tentei convencer os dirigentes a transferir a prova até que isso fosse regularizado. Eles se negaram. Resolvi não correr.
Durante a prova, um carro saiu da pista, atravessou o guard-rail e matou quatro espectadores.
Folha - Um piloto pode se negar a participar de uma corrida? A Williams concordaria se o Senna não quisesse correr em Imola?
Emerson - Eu acho que, se houvesse um motivo de força maior, concordaria.

Texto Anterior: Prost anuncia que desistiu de correr
Próximo Texto: A MISSA; A ENTREVISTA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.