São Paulo, domingo, 8 de maio de 1994
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Entidade `devolve' americana

FERNANDO ROSSETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A estudante norte-americana Jamie Melchert, 17, lésbica assumida, está discutindo com seu adovogado um processo contra o programa de intercâmbio do Rotary.
Na quarta-feira passada, o Rotary mandou Jamie de volta do Brasil para sua casa em Madison, Wisconsin (norte dos EUA). Ela estava no 45º dia de um programa que deveria durar um ano.
"Eles me disseram que eu não me encaixo no programa, que tenho uma atitude negativa. Parece que essa coisa de ser homossexual no Brasil incomoda muito", disse Jamie por telefone à Folha.
Um dos diretores do programa de intercâmbio de jovens do Rotary, que pediu para não ser identificado, afirmou que "ela não foi, em absoluto, mandada de volta porque é homossexual".
Segundo ele, a decisão foi tomada pelo conselho do programa porque "ela não estava se comportando como uma intercambista do Rotary".
"Chamamos a atenção dela diversas vezes", acrescentou.
A decisão do Rotary foi mal recebida pelos colegas de Jamie no Colégio Rio Branco, em Higienópolis (região central de São Paulo), onde ela cursava o 3.º colegial.
No dia de sua partida, pelo menos 270 alunos elaboraram um abaixo-assinado, pedindo que a posição fosse revista.
Para o membro do Rotary, "Jamie tinha charme e era muito envolvente. Mas se vestia de forma absolutamente excêntrica e se dizia homossexual".
"Os jovens vêem esse tipo de desafio como uma liderança. Mas, sem dúvida, é uma liderança negativa", diz o rotarianio.
Para um de seus colegas de classe, "Jamie simplemente se vestia como um rapper, com calças largas e caídas e camiseta grande".
"É assim que a turma dela se veste nos EUA", acrescentou o estudante, que como outros quatro entrevistados disse "ter medo" de ter o nome revelado.
"Eu não posso nem conversar com você porque eles vão descobrir quem foi", disse à Folha uma intercambista.
O Rotary afirma que "tem regras simples": "o intercambista tem que frequentar a escola, ter bom comportamento, não pode dirigir nem consumir bebida alcoólica".
Enfim, "tem que ter um comportamento compatível com o que se espera dele".
Segundo o Rotary, houve reclamações de famílias que recebem intercambistas e do próprio colégio, onde a fica entidade.
A "mãe" brasileira de Jamie, que tem um filho estudando pelo intercâmbio no Canadá, não quis comentar a expusão.
Os amigos de Jamie dizem que a "mãe" brasileira "é muito legal e está triste com essa história toda". Jamie afirma que está "muito brava e machucada".
Na sexta-feira à tarde, ela ía ao seu colégio em Madison, para ver como faria para completar seu "high school" (ou colegial).
Jamie diz que descobriu sua preferência sexual aos 13 anos e que tem uma namorada nos EUA. "Se tiver conseguido abrir a cabeça de alguma pessoa no Brasil, valeu."
Para o Rotary, "o intercambista tem que agir como um verdadeiro embaixador de seu país" e isso não estava acontecendo.

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