São Paulo, terça-feira, 10 de maio de 1994
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Cassemos os fiuzas

EMERSON KAPAZ

Cassar um "anão" flagrado pela CPI do Orçamento é fácil. Alguns desses anões contribuíram para sua própria condenação, ao se expor ao ridículo perante a opinião pública, na tentativa de desmentir seus flagrantes esquemas de corrupção.
O desafio que se coloca agora ao Congresso Nacional é cassar o mandato de um gigante. Nada contra a estatura do deputado Ricardo Fiuza. Mas o Congresso estará dando uma demonstração de grande coragem cívica, se conseguir revogar o mandato de personalidades políticas da maior grandeza: os fiuzas que representam tudo o que existe de retrógrado e fisiológico na política nacional.
Pesquisa do Datafolha foi de uma clareza indiscutível: 93% dos entrevistados consideraram o deputado Ricardo Fiuza responsável por atos que justificam sua cassação, contra apenas 7% que o inocentaram.
A população definitivamente já sabe distinguir o joio do trigo entre os políticos, e não deixa seus pontos de vista serem nublados por alianças eleitorais.
O que a nação espera do Congresso agora é que repita a coragem demonstrada em dois momentos de limpeza ética, o impeachment e a CPI do Orçamento.
Transformou-se em questão de honra a cassação do deputado Ricardo Fiuza e de todos os indiciados pela CPI que comprovadamente se tornaram indignos de continuar exercendo o mandato de que foram investidos pelos cidadãos.
Essa cassação precisa ser obtida a qualquer custo. Isso significa que o Congresso não pode permitir a vitória dos mesquinhos interesses políticos que culminaram na absolvição de Fiuza por maioria, na Comissão de Constituição e Justiça.
A cassação é necessária não apenas diante da evidente falta de decoro parlamentar do deputado, ao alterar a redação de emendas que já haviam sido aprovadas. É imprescindível e não somente com base nas fundamentadas evidências de graves irregularidades em sua gestão no Ministério do Bem-Estar Social.
A cassação é urgente não somente por causa dos empréstimos da Caixa Econômica Federal à Usina Bititinga, da família Fiuza. Em relação a esses empréstimos, a CEI (Comissão Especial de Investigação) que apura a corrupção no Executivo deixou o rei nu.
Em reunião da CEI no dia 6 de maio, o diretor comercial da CEF, José de Albuquerque Filho, confirmou a total irregularidade desses empréstimos e acusou Fiuza de ter utilizado maliciosamente, em sua defesa, as respostas fornecidas a um questionário genérico a ele enviado.
Cassá-lo é imperioso porque, aos olhos da nação, Fiuza se transformou no símbolo do político que utiliza o Estado em favor de interesses particulares e escusos, prática que impede a modernização do país e afronta a consciência cívica inerente ao exercício da cidadania.
Cabe aqui um alerta a todas as lideranças políticas responsáveis, em especial aos tucanos: ou pressionam os partidos aos quais se aliaram a comparecer em peso ao plenário e cassar os fiuzas, ou sofrerão uma fratura irreversível na coluna vertebral de credibilidade que procuram ostentar ao país.
Diga-se de passagem, tal espinha dorsal já está sofrendo os horrores de uma dolorosa ciática, devido à dificuldade que os simpatizantes do PSDB têm em engolir –essa é a palavra– o saldo da indigesta aliança eleitoral que foi feita. A indigestão, obviamente, ficou ainda mais azeda com a absolvição de Fiuza pela Comissão de Constituição e Justiça.
Chegou a hora de pegar um gigante. Mais uma vez, espera-se das lideranças políticas que mobilizem seus partidos; da sociedade civil e da população em geral, que pressionem por todos os meios a seu alcance, entupindo os gabinetes dos congressistas com fax e cartas; e dos meios de comunicação, que repitam a mobilização do impeachment, criando tarjas negras ou verde-e-amarelas e abrindo suas páginas a uma ampla cobertura, nos dias que antecedem e no próprio dia do julgamento de Fiuza pelo plenário.

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