São Paulo, sexta-feira, 13 de maio de 1994
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Eleições prévias

JOSÉ SARNEY

Os partidos políticos estão em crise, no mundo inteiro, destroçados pela mídia, que ocupou muitas das suas funções, como as de divulgar, aliciar, convencer. Ficou célebre a frase de um coordenador da campanha Clinton que afirmou que cinco minutos de TV valiam mais do que um ano de partidário.
Afinal, o que vêm a ser os partidos políticos? São grupos de pressão que, dentro da sociedade, não desejam influenciar o poder e, sim, exercê-lo. Nasceram na Europa, mas foi nos EUA que tomaram a forma que resultou no partido moderno. Deixaram de ser facções, para tomar o poder em nome de seus interesses. Na realidade, o verdadeiro partido, tal como o Democrata e o Republicano, surgiu depois da Guerra de Secessão. Mas era sempre uma organização de notáveis, de quadros, que intermediavam em nome do povo os interesses que representavam. A legitimidade era muito baixa.
No fim do século 19 surgiu um novo tipo de partido, o ideológico, de massa, com milhões de filiados, organizado para tomar o poder em nome de uma ideologia e sob a invocação do povo.
A existência desse novo modelo de agremiação fez com que o partido de notáveis procurasse democratizar seus procedimentos. Evitar que ele fosse apenas o instrumento das cúpulas. Daí o nascimento das eleições primárias, prévias e do candidato independente.
Acontece que a legitimidade das escolhas era afetada pelos processos utilizados, tentando corromper, coagir, deformar e manter fechado o ambiente partidário, que não devia florescer fora do grupo dirigente. O partido de massa era um crítico desses procedimentos, mas, na sua forma mais consolidada, que foram os partidos comunistas, substituiu a ditadura dos notáveis pela chamada democracia interna, vertical, que nada mais era do que a ditadura pura e simples da burocracia partidária, já então com conotação sectária e ideológica que foi a desgraça do socialismo real.
Já na República, os partidos eram estaduais. Em 46, na lei Agamenon Magalhães, tentamos o partido nacional. A tradição, o tamanho do país, as realidades, os opostos e contraditórios, tudo conspirava contra a unidade do que seria um partido nacional. Isto ficou tão evidente que, quando se formaram MDB e Arena, por decreto, foi necessária a volta dos partidos estaduais, nas sublegendas e, em vez de 2 partidos, tivemos 60.
Agora, fizemos uma lei para acabar com os pequenos partidos, esquecendo que eles não se acabam por leis e, sim, pela existência de um sistema. Duverger diz que o voto proporcional leva à proliferação de partidos e o majoritário, à diminuição.
A verdade é que todos os males dos partidos políticos residem em sua manipulação. Todas as medidas que se têm tentado visam à democratização dos partidos. No Brasil há a tendência, agora, dos partidos com donos. Todos querem ter o seu partido, particular, sem uma salutar militância. Para isso teríamos que mudar o sistema partidário, o voto proporcional e praticar uma verdadeira democracia interna, cuja obediência e disciplina não fossem fruto do medo da exclusão ou da discriminação e sim da capacidade e da liderança.
As prévias do PMDB foram feitas como uma cópia do que se faz nos Estados Unidos. Só que lá os partidos existem e aqui ainda não. Por isso elas não atingiram a sua finalidade e ficaram nas boas intenções.
As bases não participaram delas. E prévia sem bases e sem povo é, de novo, burocracia partidária, a antiprévia.

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