São Paulo, domingo, 15 de maio de 1994 |
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`Vou chegar à seleção', diz Luxemburgo
MÁRIO MOREIRA
Essa convicção se origina, segundo ele, da sua capacidade profissional. "Estou me preparando para ser técnico da seleção", diz Luxemburgo, embora não se considere o favorito para substituir Carlos Alberto Parreira, que deixará o cargo após o Mundial. Em entrevista à Folha, o treinador palmeirense também revelou admiração pelo coordenador técnico da CBF, Zagalo, por seus conhecimento táticos de futebol. Segundo Luxemburgo, o time do Palmeiras reflete a sua personalidade. "É um futebol participativo." A seguir, os principais trechos da entrevista. Folha - O Palmeiras correspondeu totalmente à expectativa que você tinha antes do campeonato? Luxemburgo - Sim. Tudo que aconteceu, o momento ruim que passamos, quando perdemos alguns jogos seguidos, eu sabia que poderia acontecer. A falta de equilíbrio momentânea, andar um pouquinho nas nuvens pelas conquistas passadas, tudo estava dentro do esperado. Folha - Você chegou a temer que o time não se recuperasse daquele momento ruim? Luxemburgo - Não. Tinha certeza absoluta de que o time ia se recuperar, porque conheço o caráter dos jogadores. O único episódio que me deixou preocupado foi no jogo contra o Guarani, no Parque Antarctica, em que parte da torcida nos chamou de mercenários. Tive medo de que os jogadores não soubessem reagir e o nosso andamento na competição ficasse prejudicado. Mas o grupo se fortaleceu, porque mostrou capacidade de reação, vencendo por 4 a 2. O momento era inoportuno para a torcida fazer o que fez, porque ali precisávamos de ajuda. Aquele movimento não tinha nada a ver com o nosso caráter, era exatamente o oposto. Folha - Essa manifestação da torcida está totalmente superada? Luxemburgo - Não. A torcida do Palmeiras está como o time. Aprendendo a ganhar, a conviver com vitórias, porque ficou muito tempo sem isso. Este ano, ela quase atrapalhou. Mas a torcida vai entender que, quando tem um grande time, se atuar do lado, a conquista fica muito mais fácil. Folha - Você ainda se sente perseguido pela torcida? Luxemburgo - Por parte dela, sim. Mas a torcida do Palmeiras é muito grande. Uma minoria não pode ter a representatividade a ponto de mexer comigo. Essa minoria ainda questiona o meu trabalho, mas isso é normal no futebol. Eles continuam achando que eu só ganho títulos porque o time é muito bom. O que posso fazer? Folha - O Palmeiras está melhor agora que em 93? Luxemburgo - Acho que está mais consistente na parte tática. O meio-campo, principalmente, ficou muito mais equilibrado com o Rincón. Os jogadores todos se encaixam: o Mazinho completa o César Sampaio, o Zinho completa os dois e o Rincón completa os três, cada um com uma característica diferente. Folha - O Palmeiras está preparado para ganhar a Taça Libertadores e ser campeão do mundo? Luxemburgo - A Libertadores é muito difícil, e o time do Palmeiras é calouro na competição. Só eu, o Rincón, o Zinho, o Mazinho e o Antônio Carlos já disputamos a Libertadores, e isso pesa. O time tem que se habituar à competição. Nossa idéia é ganhar a Copa do Brasil para já adquirir o direito de disputar a Libertadores em 95. Se acontecer algum imprevisto agora, teremos outra oportunidade. Folha - Lidar com grandes jogadores, cada um com sua vaidade natural, não é complicado para o técnico do Palmeiras? Luxemburgo - Todo treinador gostaria de ter uma equipe como a que tenho. O problema é você conduzir esses atletas, e no Palmeiras, além de serem excelentes, os jogadores têm caráter. E entra muito da minha personalidade também, de lidar com eles da maneira mais direta, sincera e honesta possível. Folha - A torcida do Palmeiras seria, então, a grande dificuldade de trabalhar no clube? Luxemburgo - Não. A torcida do Corinthians também age da mesma forma se o time não ganhar. Ela vai se insurgir de uma maneira diferente, mas vai. Todas as torcidas são emoção, e emoção é difícil de você conter. Folha - É possível medir em percentual a sua contribuição para o título do Palmeiras? Luxemburgo - Eu digo que 70% das conquistas pertencem aos atletas. Os outros 30% ficam para a comissão técnica e a diretoria. O treinador tem uma importância muito grande dentro das conquistas, por ter que comandar bem, ser equilibrado, ter discernimento e sensibilidade nos momentos necessários. Folha - Você sempre diz que gostaria de deixar uma marca no futebol. Como define os times que dirige? Luxemburgo - Em primeiro lugar, vem a filosofia. Tenho uma maneira própria de trabalhar, de respeito ao clube. Não faço contratos por prazo curto, só por um ano e com opção de renovação por mais um. Quando o Palmeiras me convidou, em 93, eles queriam fazer comigo um contrato de dois meses. Recusei, porque não posso ser questionado por dois meses. Essa já é uma maneira de implantar uma filosofia. Folha - E dentro de campo? Luxemburgo - A equipe do Wanderley joga sempre um futebol participativo, com variações táticas. Ela muda de um 4-4-2 para um 4-3-3 para um 4-5-1 dentro de um jogo. As minhas equipes também mostram a minha maneira de ser: aguerridas, determinadas, perseverantes. O Palmeiras é assim. É um time extremamente técnico, mas também determinado. Joga com vontade, não deixa o adversário tomar conta do jogo e sempre busca a vitória. Essa é a minha cara, a minha característica. Sou um homem determinado, busco aquilo que quero. As minhas equipes mostram essa minha face. Folha - Você acredita que necessite de algum aprimoramento específico como técnico? Luxemburgo - Todo dia é preciso melhorar, em todos os aspectos. O Telê tem 60 e poucos anos e está aprendendo ainda. Folha - Qual o principal problema enfrentado pelos treinadores no Brasil? Luxemburgo - O calendário, que é também o principal problema do futebol brasileiro. Gostaria de um calendário que me permitisse treinar minha equipe durante a semana e no domingo ver um jogo tático, bonito, apurado técnica e fisicamente. Este ano, o Palmeiras teve só quatro dias de pré-temporada e, dentro da competição, nunca tive tempo para trabalhar. A partir do momento em que tive esse tempo de novo, a equipe readquiriu seu desenho tático e voltou a render bem. Pude trabalhar a equipe taticamente, posicionar os jogadores dentro do campo. Folha - Dos técnicos atuais ou dentre aqueles com quem trabalhou como jogador, qual você mais admira? Luxemburgo - O Zagalo, com quem fui campeão carioca em 72, pelo Flamengo. Foi o maior técnico que tive. Ele conhecia muito a parte tática do futebol. Mas hoje ele está dentro do passado. Isso é normal. Também vão falar o mesmo de mim amanhã. Folha - Você acha que ele está ultrapassado? Luxemburgo - Não. Diria que ele não tem mais a mesma dinâmica, a mesma saúde, a mesma vontade, o mesmo tesão que tinha na época do Flamengo. Folha - Ele exerceu alguma influência na sua formação como técnico? Luxemburgo - Não. Não tenho nenhuma semelhança com qualquer ex-treinador meu. Acho que tenho muita coisa minha. Procuro sempre montar a equipe de acordo com os atletas que tenho na mão. Folha - O segredo de um bom técnico é saber usar as peças que tem para então montar o esquema? Luxemburgo - Exatamente. Por isso é que não tenho nunca um esquema pré-definido. Em 93, quando conquistamos o Campeonato Brasileiro, tive que mudar o posicionamento do Evair para aproveitar o Edílson e o Edmundo juntos. Este ano, a equipe se fortaleceu com o Rincón. Além de fazer a função de pivô, que o Evair vinha fazendo, ele consegue preencher o espaço no meio-campo, com técnica e velocidade. E o Evair passou para a frente e rendeu muito mais. Aí é que vem a capacidade do treinador de montar a equipe com o que tem nas mãos. Folha - Você costuma dizer que, dentro da sua profissão, almeja o máximo possível, ou seja, chegar à seleção brasileira. Você se sente hoje preparado para assumir a seleção? Luxemburgo - Trabalhei para estar preparado para a seleção, se um dia ela acontecesse para mim. Saí do Bragantino em 91 porque, se ganhasse o Campeonato Brasileiro daquele ano, seria o treinador da seleção, pois já havia sondagens. Mas acho que não estava preparado. Talvez não fosse nem questão de preparo, mas de respaldo nacional, que só o trabalho no Bragantino não me daria, mesmo sendo um excelente profissional. Então deixei de disputar o Brasileiro pelo Bragantino e fui para o Flamengo, onde a cobrança é muito maior. Aquilo foi um aprendizado muito grande para mim. No Flamengo, a postura profissional era sempre colocada em questionamento, inclusive pela imprensa. Isso tudo vai te preparando para a seleção. Eu vou ser treinador da seleção, e na hora em que ela chegar, estarei preparado. Mas não como uma obsessão. O Rubens Minelli esteve várias vezes para ir para a seleção e nunca foi. Tenho que estar preparado para isso também. Folha - O Carlos Alberto Parreira já disse que não pretende continuar como técnico da seleção após a Copa do Mundo. Você acha que será o favorito a ocupar a vaga? Luxemburgo - Favorito, não. Mas o meu nome está aí não é de hoje. Em 91, quando o Falcão deixou o cargo, isso já existia. No ano passado, durante as eliminatórias para a Copa, eu e o Telê fomos muito lembrados. Acho que vou ser o técnico da seleção pela minha competência. Vai acontecer com naturalidade. Texto Anterior: Empate hoje dá ao Novorizontino título no campeonato de aspirantes Próximo Texto: Técnico leva seu 4º título Índice |
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