São Paulo, domingo, 15 de maio de 1994
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Projeto Genoma identifica um gene por dia

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

O monumental projeto Genoma Humano objetiva mapear todos os cerca de 100 mil genes humanos, com sua função e suas sequências químicas.
Seu coordenador, Francis Collins, está exultante com os resultados até aqui obtidos, um gene localizado por dia.
Com o aumento de colaboradores e a introdução de novas técnicas, tudo indica que ele poderá confirmar para 2005 o fim do empreendimento.
Sonha W. French Anderson, o pioneiro da geneterapia, com uma futura medicina muito mais positiva que a atual.
Através dela, o médico, uma vez diagnosticada a doença, poderá "receitar" um pequeno fragmento de DNA (ácido desoxirribonucléico, a matéria prima do gene) para ser inserido no paciente a fim de substituir o gene eventualmente defeituoso ou ausente.
Ou então a ministração de alguma proteína ou droga, natural ou sintética, que o gene defeituoso ou ausente deixe de fabricar e que é essencial à vida sadia.
As coisas na verdade não são tão simples, porque há doenças em que intervêm vários genes ou genes com muitos defeitos.
A primeira tentativa de geneterapia coroada de êxito ocorreu há uns três anos.
Deveu-se à iniciativa de Anderson diante de duas meninas que sofriam de gravíssima doença que consiste em deficiência imunológica devida a insuficiência de uma enzima.
A enzima, adenosina-deaminase (ADA), é essencial para manutenção da integridade funcional do sistema de defesa do organismo.
Era hábito tentar a cura ou melhora da doença pelo uso de ADA de origem porcina, mas os resultados eram precários.
Anderson decidiu inserir nas meninas doentes o gene sadio da ADA. Para isso, extraiu sangue delas, separou os glóbulos brancos e neles introduziu o gene, reinjetando o sangue nas pacientes e esperando que o corpo se encarregasse de levar os genes a seus destinos.
As meninas passaram a viver normalmente ao ar livre, mas como os glóbulos morrem ao fim de algum tempo, ficaram obrigadas a repetir periodicamente a operação.
Michael Blaese e Kenneth Culver tentaram evitar esse inconveniente injetando os genes nas chamadas células matrizes, ou "tronco" do sangue, que se encontram na medula óssea e originam todas as células de sangue.
Desse modo, os genes estariam sempre se renovando, e uma única operação bastaria para toda a vida. A operação já foi realizada, mas os resultados finais ainda não foram revelados.
A geneterapia passou a ser utilizada em outros centros (atualmente cerca de 40) de todo o mundo.
O momento mais delicado da operação consiste na inserção do gene novo no glóbulo do paciente.
Para realizá-lo, o especialista tem de dispor de moléculas transportadas ou vetoras, que incorporem o gene e o distribuam pelo organismo.
Essas moléculas em geral são vírus inócuos ou atenuados, mas num caso se experimentou dispensar o vírus e fazer a inserção direta do gene no paciente.
Para isso, o gene foi envolvido em microbolinhas de gordura (lipossomos), injetadas num doente com tumores. Pelo menos num caso, o tumor secou.
Resistência
A geneterapia abre sem dúvida formidáveis caminhos à medicina, mas o sonho de Anderson tem ainda de enfrentar muita resistência ética, política, social e jurídica.
O uso do mapa genético praticamente quebra a privacidade, o que pode criar muitas situações perigosas, como em relação ao trabalho e à seguridade social.
A engenharia genética oferece muitas outras possibilidades, além das prometidas por esse mapa genético.
Para dar um exemplo, basta citar a experiência em que pesquisadores ingleses e norte-americanos obtiveram leitões transgênicos, em cuja produção entraram genes humanos.
Esses animais fabricam proteínas humanas que podem suprimir a reação imunológica de recipiente de um transplante, pelo menos teoricamente.

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