São Paulo, segunda-feira, 23 de maio de 1994
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Folha - Dá tempo de terminar o julgamento de todos os acusados pela CPI do Orçamento até o final de maio, como o previsto?

DENISE MADUENO

Deputado José Thomaz Nonô - Não. Estou muito preocupado porque ainda faltam três processos e um em fase de julgamento. Dois deles, de Ézio Ferreira (PFL-AM) e Flávio Derzi (PP-MS) estão dependendo de diligências para conclusão.
No processo do deputado Paulo Portugal (PP-RJ), o relator, Euclydes Mello (PRN-SP), considera fundamental ouvir uma testemunha que está desaparecida desde a época da CPI.
Estou extremamente preocupado porque conheço a Casa e no dia 31 se encerram as convenções dos partidos e deflagra-se a campanha eleitoral. A tendência é não haver quórum (número de parlamentares necessário para a sessão) a partir de junho.
Folha - O que fazer?
Nonô - Vamos ter que adotar outra estratégia para concluir os processos. Marcar os três julgamentos para uma semana e fazer um tipo de esforço concentrado" para finalizar todos os processos.
Folha - Quando?
Nonô - Por mim, em junho. É difícil dar um prazo porque depende dos relatores concluirem seus pareceres.
Folha - O término do julgamento dos deputados Ricardo Fiuza (PFL-PE) e Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) vai esvaziar a votação dos outros processos?
Nonô - Não. Acho que eles vão ter menos repercussão política.
Folha - Por que o deputado Ricardo Fiuza foi inocentado e Ibsen Pinheiro, cassado?
Nonô - Particularmente acho que ambos deviam ter o mesmo destino. Só revelo isso porque já se passou o julgamento.
A minha explicação, não é justificativa e não significa que eu concorde com o veredicto, é que Ricardo Fiuza adotou uma estratégia de defesa distinta da do deputado Ibsen Pinheiro.
Primeiro, Fiuza criou um clima favorável na imprensa para a sua absolvição. Nos dias que antecederam ao julgamento todos os grandes jornais colocaram entrevista com o deputado e os comentaristas mais expressivos falavam que não poderia haver "linchamento político".
O deputado Fiuza foi mais eficiente em sua defesa que Ibsen. A acusação contra Fiuza foi também menos contundente e específica do que a de Ibsen Pinheiro.
Fiuza procurou sensibilizar individualmente cada um dos parlamentares. Evidentemente, tinha um acervo de favores prestados infinitamente grande e isso sensibiliza alguns corações mais ternos desta Casa.
Ibsen não teve o seu período de benesses e tinha pouco a cobrar de suas gentilezas. No fundo prevaleceu um julgamento de interesse individual.
Fiuza explorou um ponto, aberto pelo relator Hélio Bicudo (PT-SP), que foi tentar um julgamento ideológico.
Folha - Foi um julgamento ideológico?
Nonô - Jamais foi um julgamento ideológico. Aqui nunca houve pacto de partidos, de direita ou de esquerda.
Pelo contrário, eu tenho convicção que muitos deputados de esquerda absolveram o deputado Ricardo Fiuza. Não posso dar os nomes porque jamais provarei, já que os votos são secretos, mas conheço as pessoas.
Folha - Quando o sr. defende o mesmo destino para os deputados Fiuza e Ibsen, defende a cassação dos dois?
Nonô - Defendo o destino justo.
Folha - Qual é o destino justo?
Nonô - Não me cabe definir porque revelaria um voto que deve ser secreto. Como me parece que ambos tinham uma responsabilidade política muito grande, e frustraram a opinião pública nacional, o destino devia ser igual.
Folha - A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) teve dificuldades com os processos?
Nonô - A comissão teve imensas dificuldades porque constatou lacunas, imperfeições e falhas gritantes na CPI e nós não podemos fazer nada. Não podemos quebrar sigilo bancário, um privilégio das CPIs.
No fundo tivemos que trabalhar com um material imperfeito e incompleto que vinha da CPI e com a representação da Mesa também passível de críticas.
Tínhamos que trabalhar com o que veio. Lamentavelmente, em alguns casos, o que veio foi profundamente imperfeito. Muitos pontos ficaram misteriosamente sem aprofundar.
Até hoje não explicaram porque incluíram alguns nomes e excluíram outros. Falo como cidadão. Até hoje eu não entendo.
Folha - Por exemplo.
Nonô - A inclusão do deputado Aníbal Teixeira (PP-MG), e esse faço questão de externar o meu voto pela absolvição, a acusação era cretina. Não tem outro qualificativo.
Entretanto outros personagens, e não vou dizer os nomes, de notória má fama nesta Casa e fora dela, foram sumariamente excluídos.
Outros parlamentares que gozam de excelente fama não tiveram os indícios de prova esmiuçados com a mesma pertinência e perspicácia que usaram contra Ibsen, para citar um exemplo.
Não é uma crítica a ninguém. A CPI do Orçamento teve um tempo exíguo e se desenvolveu em um clima muito emocional. Se fez um trabalho rápido, mas a qualidade ficou a desejar.
Folha - Depois que a CCJ inocentou os deputados Fiuza e João de Deus Antunes (PPR-RS) o sr. ameaçou sair da presidência da comissão. Por quê?
Nonô - Eu não sou juiz de ninguém, mas achei a decisão surrealista. No julgamento do deputado João de Deus teve sete abstenções em um único fato.
Ou você absolve ou condena. Era um único fato. Você pode concordar ou discordar, mas abster-se! Eu achei frustrante permanecer na comissão.
Eu acho que devemos estar sintonizados com a opinião pública. Não é fazer o que a opinião pública quer, mas ficar atento ao que se passa fora desta casa, sob pena de se tornar um alienado.
Folha - O sr. recebe muitas pressões?
Nonô - Tenho recebido todos os acusados e a conversa é constrangedora. Tive uma conversa com o deputado João Alves, por exemplo, que pretendeu me convencer da coincidência de seus sucessivos ganhos na loteria esportiva. Isso já é constrangedor.
Outros que não vou revelar os nomes, falam do sofrimento dos filhos e da família. É um tipo de pressão emocional. Recebi um telefonema da deputada Raquel Cândido na minha casa, à 1h30, patético.
Não era telefonema ameaçador, pelo contrário. O problema é que quando ela desligou o telefone deve ter ido dormir e eu fiquei acordado.
Era um relato de alguém completamente transtornado. De um ser humano destruído e isso não me dá prazer algum.
Há outro tipo de pressão, a da imprensa. Há a ânsia pelo prazo de julgamento. Há a pressão da população. Parte dela personaliza no presidente da comissão o julgamento.
Dão a nós um poder que não temos. Não sou eu que condeno nem absolvo. Emagreci 5 kg. Pelo menos fiquei esbelto.

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