São Paulo, segunda-feira, 23 de maio de 1994
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São Paulo lá

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

SÃO PAULO – Não se sabe quem vai para o trono, mas uma coisa parece certa: o Brasil entrará em 95 sob o signo de São Paulo. Ganhe o carioca Fernando Henrique Cardoso, ganhe o pernambucano Luiz Inácio Lula da Silva, será a política paulista que chegará ao poder - tanto quanto se o ungido for Orestes Quércia, o filho de Pedregulho e a pedra no sapato da atual polarização na corrida para o Planalto.
Dos três, o que mais se aproxima do último fenômeno político gerado em São Paulo é Quércia: não tem o carisma, não tem a dimensão, mas depois de Jânio Quadros foi o único a criar seu próprio "ismo" no Estado. Preserva de Jânio a vocação populista, mas a ela acrescentou uma impressionante capacidade de organização e instrumentalização de máquinas. Em dez anos criou mais de 300 diretórios do PMDB, manteve sob suas rédeas o interior do Estado e já demonstrou –como Jânio– que é capaz de eleger um poste.
Lula e Fernando Henrique, cada um à sua maneira, representaram algo de "novo" na política do Estado –não foram gestados, ao menos, na incubadeira do populismo tradicional, destacam-se claramente da herança de Jânio, Ademar e congêneres.
Sintomaticamente, nem um nem outro conseguiu o voto paulista para cargos executivos. Lula, representante do movimento sindical, cresceu cercado pelas teses socialistas de professores da USP (território de FHC) e sempre chegou às eleições como uma assombração para a classe média paulista.
Fernando Henrique, filho de uma certa consciência republicana, com inclinações européias, representa uma São Paulo mais ilustrada, que aspira a uma maior racionalidade na organização da selvageria capitalista que aqui se instalou. Embora tenha penetração na classe média que rejeita Lula, perdeu a Prefeitura para Jânio. Não sabia onde ficava Sapopemba.
Dessas três São Paulos, a de Lula é hoje, claramente, a mais "nacionalizável". Fala em nome de uma massa a quem a política brasileira nada tem oferecido –a não ser promessas. A São Paulo de Fernando Henrique está longe de encontrar eco nacional –precisa, por isso mesmo, do complemento pefelista nordestino, conservador e oligárquico.
Quércia, dos três, é o mais próximo da São Paulo real. Mas tamanho realismo levou-o a uma arapuca. Não é com uma ponta de dor no coração que o poder econômico do Estado vai abandoná-lo à própria sorte.

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