São Paulo, sábado, 28 de maio de 1994
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Corpo dança composições de Philip Glass

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Depois de criar músicas para os mais importantes coreógrafos norte-americanos, Philip Glass entra agora para o repertório do Grupo Corpo.
"Sete ou Oito Peças para um Ballet", que o Corpo estréia na próxima quarta-feira no Teatro Municipal de São Paulo, é dançada ao som de uma composição feita especialmente por Glass para instrumentos do Grupo Uakti.
Em entrevista à Folha de Nova York, por telefone, Glass afirmou que a música para o balé do Corpo concretiza um antigo desejo de trabalhar com o Uakti e seus instrumentos incomuns, feitos de tubos de PVC, vidro, madeira, água, latas.
Para o novo balé do Corpo, Glass compôs 12 temas livres que depois foram arranjados e adaptados aos instrumentos por Marco Antonio Guimarães, fundador e compositor do Uakti.
No final, foram selecionados sete temas, que ganharam mixagem definitiva em Nova York, em janeiro passado.
Glass não poderá vir ao Brasil para as primeiras apresentações de "Sete ou Oito Peças para um Ballet". Ele também acaba de completar uma nova ópera, baseada no filme "A Bela e a Fera", de Jean Cocteau.

Folha – Você já criou músicas para balés de Jerome Robbins e Twyla Tharp. Existem diferenças entre as composições para balé e as músicas para óperas, filmes ou peças de teatro?
Philip Glass – São muito diferentes. Para filmes ou óperas, eu geralmente tenho que seguir algum tipo de história.
Um balé pode ser mais abstrato, ou seja, não tenho que seguir uma determinada estrutura que eu tenha aceito de antemão. Quando escrevo música para balé, eu fico mais livre com relação à estrutura da dança.
Folha – Você costuma participar do processo coreográfico ou em geral compõe sozinho, antes de levar a música ao coreógrafo?
Glass – Entre os vários coreógrafos para os quais trabalhei, seja Lar Lubovitch, Alvin Ailey, Robbins, Twyla ou Rodrigo Pederneiras, quase sempre eles me pedem que a música fique pronta antes da criação coreográfica.
O processo começa com a música e isso parece ser a maneira como os coreógrafos preferem trabalhar.
Nunca me envolvi com o processo de criação de uma coreografia, mas posso ter discussões prévias com o coreógrafo, antes da concepção do espetáculo.
Folha – Por que você decidiu compor para o Grupo Corpo?
Glass – Eu já conhecia o trabalho do Corpo. Vi o grupo dançando "21" no Teatro Municipal de São Paulo e, na minha mente, ficou a imagem de uma boa companhia. Depois, quando soube que o Corpo queria trabalhar comigo, fiquei muito feliz.
Folha – Por que utilizar instrumentos do Grupo Uakti nessa música feita para o Corpo?
Glass – Fazia tempo que eu admirava a música do Uakti. É uma música única, muito bonita e original.
Há anos eu e o pessoal do Uakti vínhamos tentando realizar uma colaboração. Mas, até então, não tínhamos conseguido definir em que tipo de projeto.
Quando o Corpo solicitou uma composição de minha autoria, todos nós concluímos que seria uma boa oportunidade para executar nosso antigo desejo.
Folha – A pareceria com o Grupo Uakti representa um fator novo em sua carreira?
Glass – Sim, porque raramente eu trabalho com orquestras estranhas às conformações que costumo utilizar. O Uakti trouxe muita criatividade ao projeto, porque não é apenas um grupo de performance. Seus integrantes possuem uma música própria.
Na fase de adaptação da minha partitura aos instrumentos eu não tenho tempo para estar presente o tempo todo.
Habitualmente, quando componho para grupos musicais, mesmo os mais conhecidos, como o Kronos Quartet, eles basicamente tocam a música que dou a eles. No caso do Uakti, eles trabalham criativamente a música, com idéias novas e isso acrescenta muito à obra.
Folha – Esse trabalho lhe trouxe novas referências musicais?
Glass – Não sei dizer se com relação à música em si. Há sempre um tipo de continuidade, um tipo de estudo com relação às minhas composições. Sinto que há um constante desenvolvimento de idéias, de uma peça a outra.
Nesse sentido, a composição para o Corpo não é diferente. Acho que a diferença está no processo de trabalho que escolhemos.
Folha – Como se caracteriza a música feita para o balé do Corpo?
Glass – É uma música abstrata, sem temas específicos. Fundamentalmente, é uma peça tonal, que em termos de estrutura é influenciada pelo desenvolvimento rítmico da música.
Acho que o fato de minha música ter a estrutura rítmica como principal componente contribuiu para o sucesso da associação com o Uakti.
Folha – Como você conheceu o Uakti?
Glass – Conheci o grupo e seu diretor-compositor, Marco Antonio Guimarães, há cerca de quatro anos, quando Paul Simon estava no Brasil gravando o disco "Rhythms of the Saints".
Foi Simon que me convidou para ouvir o grupo, certo de que eu gostaria. E eu realmente gostei muito, quando os ouvi tocando num estúdio no Rio.
Tempos depois, quando comecei a trabalhar com a gravadora Point Music, eu convidei o Uakti para gravar. O grupo já fez dois discos com esse empresa e provavelmente fará mais.

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