São Paulo, quinta-feira, 16 de junho de 1994
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Demitidos da CMTC

FRANCISCO WHITAKER

Há políticos que mentem com tanta desfaçatez que provocam riso. Mas é dramático quando inverdades criam dificuldades para outros seres humanos. Foi o que aconteceu com o prefeito de São Paulo e a "privatização" da CMTC.
Já a "privatização" era enganosa. A prefeitura não "vendeu" a CMTC: repassou linhas a empresas privadas, usando a mesma lei de municipalização que o prefeito tanto criticava –não sem descumpri-la em algumas de suas determinações, em benefício das empresas.
O que ele fez de fato foi somente desmantelar a CMTC, deixando-a sem receita e despedindo a maior parte dos seus empregados, ou pelo menos seus motoristas e cobradores, já que o número de diretores e assessores continua o mesmo, apesar da enorme diminuição dos seus dirigidos.
Até aí pode-se no entanto dizer que, verdadeira ou não a "privatização", tudo decorreu de uma mudança de concepção sobre o papel do poder público nos transportes coletivos. O inaceitável foi a trágica mentira pregada aos trabalhadores.
Ao anunciar que entregaria as linhas às empresas privadas, o prefeito garantiu que seriam todos absorvidos por essas empresas. E insistiu nessa falsidade, repetindo-a sempre, diríamos até cinicamente, mesmo depois que a diretoria da CMTC considerou que tal condição não poderia ser incluída no contrato com as empresas.
Com isso ele jogou irresponsavelmente numa dramática situação mais de 18 mil famílias. Que hoje, além de se somarem aos milhares de trabalhadores desempregados pela atual recessão, têm de enfrentar, na busca de emprego, o preconceito contra "os demitidos da CMTC" dos que se deixaram levar por uma perversa propaganda contra essa empresa pública.
Só temos portanto que apoiar uma das respostas que esses "demitidos" querem dar à grande mentira de que foram vítimas: começa a ser discutida por eles a experiência vivida pelos desempregados da crise de 83, que formaram "Grupos de Solidariedade" com o apoio da Associação Paulista de Solidariedade no Desemprego.
Reunindo na ajuda mútua desempregados e pessoas com emprego, em seus bairros de moradia, esses grupos eram –e podem vir a ser para os demitidos da CMTC– o antídoto eficaz e necessário ao desespero.
Se frutificar essa iniciativa, a força desses trabalhadores aumentará. E nos desafiará a sermos também solidários. Será nossa resposta ao desprezo pelo povo que se esconde por trás do discurso enganoso do prefeito.

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