São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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Fundos de capacitação tecnólogica: uma proposta

ANTONIO KANDIR

Fundos de capacitação tecnológica: uma proposta
Técnicos do setor público e membros da comunidade científica têm insistido quanto à necessidade de haver uma política articulada de capacitação tecnológica. Estão cobertos de razão. Hoje, o país que não estiver capacitado a acompanhar a rápida evolução dos padrões tecnológicos é um país sem futuro.
O Brasil não está em posição confortável a esse respeito. Nosso investimento global em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias estacionou em ínfimo 0,7% do PIB, com a irrisória participação do setor privado no investimento global (cerca de 10%).
Trata-se, portanto, não apenas de aumentar o investimento em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias, mas também de fazer com que um número cada vez maior de empresas privadas invista mais nessa área.
Para tanto, é preciso estabelecer mecanismos capazes de alavancar recursos para investimento em tecnologia. Passo importante está para ser dado com a regulamentação da lei 8.861, que concede incentivos fiscais às empresas que, em parceria com centros universitários, investirem em projetos de desenvolvimento tecnológico.
Com a preocupação de reforçar a política de incentivo ao desenvolvimento tecnológico, lanço ao debate a proposta de constituição de um mecanismo de geração de recursos que me parece conciliável com a lei 8.861 e com outras formas de financiamento feitas diretamente com recursos do Tesouro.
Em linhas gerais, proponho a formação de fundos de capitalização, administrados por instituições financeiras privadas, cujas cotas representassem a participação de seus detentores no retorno potencial de programas de desenvolvimento tecnológico (royalties derivados da comercialização de patentes geradas pelos programas).
Na identificação e habilitação de programas, as instituições financeiras atuariam em parceria com uma comissão formada por membros da comunidade científica nomeados por notório saber, cabendo a esta última emitir parecer técnico final a respeito.
O incentivo para o público comprar cotas desses fundos seria a possibilidade de deduzir estas despesas do imposto de renda devido. Note-se que a dedução estaria condicionada à compra de cotas desses fundos, de modo a que se possa gerar um acréscimo genuíno de poupança, para fins de investimento em tecnologia.
Parte dos recursos seria destinada a um fundo de sustentação de cotas, a ser gerido por instituição como a Finep, que teria por finalidade, como o próprio nome indica, sustentar o valor das cotas de programas que, avaliados como promissores, sofressem problemas momentâneos de rentabilidade.
O fundo de sustentação teria importância sobretudo enquanto persistisse certo retraimento previsível do público em face dessa alternativa de investimento.
O detalhamento técnico dessa proposta requer debate e estudos mais aprofundados. Sua viabilidade prática depende da aprovação de uma lei de patentes que dê segurança aos produtores de tecnologia e aos potenciais compradores de cotas de projetos de desenvolvimento tecnológico.
Depende também de que se consolide a estabilidade econômica, alterando os requerimentos de liquidez e rentabilidade dos vários ativos financeiros.
Nenhuma dessas precondições, porém, está fora do alcance. Temos agora uma possibilidade real de estabilizar a economia, ocorreram avanços nas negociações em torno da lei de patentes (urge o Congresso definir-se sobre a matéria) e não falta competência técnica na sociedade para detalhar e operacionalizar a proposta que apresento, ainda como esboço.
Se for possível transformá-la em realidade, penso que poderemos dar passo importante no sentido de mobilizar o setor privado, em parceria com a universidade, para prospectar e financiar programas de investimento em desenvolvimento tecnológico. O Brasil precisa disso, e muito.

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