São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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Quem segura Itamar?

LUÍS NASSIF

Na conversa mantida pela equipe do real com jornalistas econômicos, na última sexta-feira, resultaram as seguintes impressões:
1) A equipe está bem fundamentada para defender a metodologia de cálculo da inflação em real, sem o resíduo inflacionário de junho. Como demonstrou o economista Gustavo Franco, em setembro do ano passado trocou-se o cruzeiro pelo cruzeiro real, dentro da mesma metodologia, sem que houvesse questionamentos.
Se uma cesta básica custasse CR$ 100 mil em agosto, em setembro passaria para CR$ 120,00. Se se fosse comparar os valores, sem levar em conta as moedas, haveria deflação de 99,88%.
Para evitar essas distorções óbvias, todos os institutos de pesquisa transformaram os preços de agosto (que eram cotados em cruzeiros) em cruzeiros reais, cortando três zeros da planilha.
É o mesmo princípio que foi adotado na medida provisória que determinou a fórmula de cálculo para o primeiro mês da inflação em real, comparando com os preços de junho em URVs.
2) A equipe não passa convicção, por enquanto, em relação à chamada âncora da economia. Pérsio Arida sustenta que a verdadeira âncora será a monetária. Fixam-se metas nominais de expansão da moeda e deixa-se que toda a economia se ajuste ao novo nível de moedas, inclusive a taxa de juros.
Não explicou quem irá colocar o guizo no gato –convencer Itamar Franco da validade das idéias. Nem como colocar o plano a salvo das interferências futuras do presidente, se por acaso os juros explodirem.
3) Haverá em breve um pacote estimulando as exportações. Do lado do BNDES, linhas de financiamento permitindo às empresas brasileiras operarem em igualdade de condições com os competidores externos, tanto nas licitações internas quanto nas exportações. Do lado da Fazenda, um pacote destinado a estimular as exportações de serviços.
Inflação residual
O mercado pretende receber, depois da virada do real, o que ele julga dez dias de inflação residual em cruzeiros para os títulos em IGP-M. O Banco Central alega –com razão– que essa inflação residual é meramente estatística.
O que Alves Sobrinho sugere é simples. No dia 30 de junho o Banco Central resgata todos os papéis com IGP-M com seus valores atualizados até o último dia pela inflação de junho.
Depois oferece como alternativa ao mercado novos títulos, medidos pela nova inflação em reais. O resultado será o mesmo pretendido pelo BC e acaba com a discussão.
Cartórios sindicais
Esta semana a repórter Cristiane Perini Lucchesi, da Folha, informou que o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, ligado à Força Sindical, resolveu suspender por tempo indeterminado os pagamentos que fazia ao Dieese.
Motivo: o órgão, sustentado por entidades sindicais, apurou em sua última Pesquisa de Emprego e Desemprego na Grande São Paulo (PED) que o rendimento médio mensal dos assalariado aumentou em 2,6% em março, após a implantação da URV.
É óbvio que se a urvização dos salários tivesse provocado os prognósticos de perdas de 30% a 50%, apregoados pelo Dieese e aceitos acriticamente por parte da imprensa, não teria ocorrido o aumento anotado.
"Ao divulgar tal número o Dieese fala contra o trabalhador e traz o inferno à nossa categoria", explicou o presidente do sindicato, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho.
Num momento em que o Dieese consegue superar a politiquice que tomou conta dele, e comportar-se de maneira intelectualmente idônea, merece a solidariedade de todos aqueles que acham que a busca da verdade econômica deve ficar acima das paixões e das manipulações políticas.

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