São Paulo, domingo, 26 de junho de 1994
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Violência mata mais entre os jovens

GILBERTO DIMENSTEIN
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A pesquisa revela que, atualmente, o homicídio está em primeiro lugar entre as causas de morte da juventude.
A pesquisa foi feita pelo CBIA (Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência). O órgão é vinculado à pasta do Bem-estar Social.
Os números baseiam-se em levantamentos feitos junto a institutos de medicina legal de todo o país. Constatou-se o aumento das mortes violentas tanto entre crianças como entre os jovens.
Em segundo lugar, aparecem os acidentes de trânsito e os atropelamentos.Só no primeiro semestre de 93, houve um número apenas ligeiramente inferior de mortes violentas do que em todo ano anterior.
Em 92, segundo a pesquisa, foram detectadas 3.213 mortes. Nos seis primeiros meses de 1993, o número foi de 2.538.
"Temos noção de que todos esses números estão subestimados pela dificuldade de obtenção dos dados", pondera a presidente do CBIA, Regina de Lúcia Quadros.
Apesar da fragilidade estatística e do aumento da consciência dos governantes sobre a situação da infância, os índices de violência continuam crescendo.
É uma violência que não se limita aos grupos de extermínio, mas estende-se à polícia, família e guerra de gangues, nas quais os jovens são manipulados pelo crime organizado.
Os homicídios são, porém, apenas o aspecto mais acentuado do desrespeito diário e sistemático contra a infância brasileira.
Segundo o IBGE, 53,5% das crianças e adolescentes brasileiros vivem em famílias que ganham, per capita, até um salário mínimo (32 milhões de pessoas).
É unânime a visão entre autoridades e entidades não-governamentais de que o Brasil, com seu potencial econômico, teria condições de apresentar melhores indicadores sociais.
O Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) publicou relatório, no ano passado, com a taxa de mortalidade de crianças até 5 anos em todos os países.
O Brasil aparece em 67º lugar, junto de países como o Marrocos, na África do Norte e perde para Síria e Jordânia.
Está abaixo de países situados numa das regiões mais pobres, o sul da Ásia. É o caso do Sri Lanka, que obteve a 22ª colocação. Na América do Sul, o Brasil só perde para o Peru e Bolívia.
Mas o Unicef, nesse relatório, comparou a mortalidade infantil com o PIB (conjunto de produtos e serviços produzidos por uma nação). E, aí, a situação do Brasil fica ainda pior.
Apesar dos avanços econômicos, em matéria de melhoria social, o país está em último lugar na América do Sul, com 36 pontos negativos.
Por esse critério, a Colômbia está em primeiro com 35 positivos. Depois vem o Paraguai (22 positivos), seguido do Chile e Uruguai.
Os números podem estar ainda subestimados. A Igreja Católica acaba de divulgar pesquisa com 1,3 milhão de famílias espalhadas em mais de dois mil municípios.
Constatou-se um aumento da mortalidade infantil (crianças até 1 ano) em 15% nas famílias acompanhadas pela Pastoral da Criança. A taxa sobe para 30% no Nordeste.
Essa revelação levou o ministro da Saúde, Henrique Santillo, a reconhecer que está ocorrendo hoje no Brasil um "genocídio".
Disse Santillo: " O aumento da mortalidade é um reflexo direto do empobrecimento de uma população". Segundo dados oficiais, morrem por ano, antes de completarem cinco anos, 247 mil crianças –quase 700 por dia.
Não é apenas uma questão de renda, mas de investimentos sociais. O Ministério da Saúde informa que, de cada dez internações de crianças em hospitais, sete devem-se a péssimas ou inexistentes condições de saneamento básico (água e esgoto).
O Ministério da Educação afirma que, de cada mil crianças que se matriculam na primeira série do 1º grau, apenas 250 se formam. Desse total, apenas 65 não repetem de ano.
"É uma situação vergonhosa. Estamos perdendo a guerra da educação básica, quando o mundo já descobriu que, sem um trabalhador escolarizado, a produtividade sai comprometida", disse o ministro da Educação, Murílio Hingel.
Em países como Austrália, Finlândia, Japão e Suécia, de cada mil crianças, exatamente mil concluem o primeiro grau. Na Alemanha e Noruega 970 concluem.
O Brasil perde até para Bolívia (600) ou Paraguai (670). Em Bangladesh, uma das nações mais pobres, a taxa é 470.

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