São Paulo, domingo, 26 de junho de 1994
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Revisão exclusiva agita os constitucionalistas

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Os constitucionalistas brasileiros estão em franco debate a respeito da revisão exclusiva. Como sempre acontece, há opiniões para todos os gostos, dos radicalmente favoráveis aos radicalmente contrários.
O assunto é complicado, tanto em nível da teoria jurídica, quanto em nível político. A posição do professor Paulo Bonavides, que é, sem favor, um dos mestres mais respeitáveis do constitucionalismo brasileiro. Mostra a dificuldade. Ele foi contra o adiamento da revisão prevista no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) para 1995. Todavia, a princípio aplaudiu a hipótese da revisão exclusiva. Depois, mudou de pensar, passando a considerá-la funesta, conforme comentário de imprensa que assinou.
Em análise anterior, nesta coluna, enunciei minha posição: sou favorável a que se instale assembléia destinada exclusivamente ao exame das deficiências da Carta de 1988, para ajustá-la às necessidades nacionais. Reconheço que a posição adotada pode permitir iniciativas contra as conquistas libertárias obtidas em 88. Logo me tranquilizo, porém, quando vejo que esse perigo já existia com a revisão prevista pelo ADCT, mas não se concretizou, ante a atenção eficaz e permanente dos defensores daquelas conquistas. A incipiente democracia brasileira passou incólume por essa prova.
Recentemente o deputado José Genoino no auditório desta Folha, disse que a Carta de 88 foi feita com olhos no retrovisor para impedir a volta da opressão passada. Está na hora de lançarmos olhos para o futuro. A reforma da Constituição é possível e necessária. Deve, porém, ser conduzida com cuidado, através do processo de emenda, observada a maioria de três quintos, nas duas casas do Congresso.
A Carta de 88 não limita o campo das emendas, salvo na hipótese do que os juristas têm chamado (o nome é de um mau gosto extraordinário) de cláusulas pétreas, previstas no artigo 60, parágrafo quarto. Assim, será rigorosamente constitucional que se credencie, por emenda, uma assembléia exclusiva, conforme norma transitória que delimite com clareza o campo a ser examinado, o prazo, a época, o procedimento eleitoral, a pauta a ser percorrida. Tudo, sob quorum privilegiado, que impeça a dominação.
O tema é tão tempestuoso que a primeira atitude dos que o discutem é a de ver desígnios malignos na preferência de seus opositores. Uns falam em "fujimorismo" potencial, outros dizem dos sombrios interesses conservadores, outros ainda vêm soturnos caminhos ditatoriais.
Mantenho, porém, minha posição favorável. Todos estão de acordo em que a Constituição de 88 é razoavelmente boa. Todos estão de acordo em que é razoavelmente defeituosa. Revisando-a, obedecidos os preceitos da emenda e do quorum, manteremos o que tiver de bom, corrigiremos o que tiver de mau, para que continue o instrumento básico do direito e da democracia, neste país.
A revisão não é, porém, o único elemento de garantia de aprimoramento. Seria necessário que o Congresso Nacional e o Poder Executivo (nas leis cuja iniciativa privativa é dele) completassem o quadro legislativo brasileiro, permitindo a operacionalidade plena da Carta de 88. Muitas das deficiências apontadas não dependem da Constituição. Dependem do processo legislativo comum. Isso não impede o exame da revisão exclusiva como remédio útil, ante o fracasso da revisão congressual.

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