São Paulo, domingo, 26 de junho de 1994
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Tortura sem pena

A inoperância do Congresso Nacional dá contornos surreais ao Brasil. Proibida pela Constituição e por vários tratados internacionais dos quais o país é signatário, a tortura permanece, em termos estritamente jurídicos, um crime pelo qual ninguém pode ser punido, pelo menos quando usada contra maiores de 18 anos. Foi essa pelo menos a conclusão a que chegou o Supremo Tribunal Federal esta semana.
E essa tremenda distorção se deve única e exclusivamente à abulia dos parlamentares que, quase seis anos depois da promulgação da Carta de 1988, ainda não regulamentaram uma lei que defina uma pena para quem incorrer no crime de tortura. E essa é apenas mais uma entre as dezenas de leis que teriam de ter sido elaboradas por exigência constitucional e que simplesmente foram esquecidas.
É claro que ausência de uma pena para o torturador não impede que ele venha a ser castigado com recurso a outros tipos penais como, por exemplo, o de lesões corporais. Ainda assim, a lacuna é reveladora do descaso do Congresso para com os compromissos jurídicos que a nova ordem constitucional instaurada em 1988 lhe atribuiu.
E, mesmo com as suas inúmeras lacunas e equívocos, não se pode exigir que a Constituição funcione se não se lhe dá o ambiente jurídico que ela própria está a cobrar. Tão urgente quanto emendar as falhas da Carta é regulamentar tudo aquilo que os legisladores esqueceram em seus escaninhos. E, convenha-se, é bom reiterar, não é pedir demais aos legisladores que façam aquilo que se exige de todos os brasileiros: que cumpram suas obrigações.

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