São Paulo, domingo, 3 de julho de 1994
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A dificuldade faz o homem

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

No dia em que Ben Gurion, primeiro ministro de Israel, soube que o presidente Jânio Quadros havia renunciado, exclamou: "Não entendi, pois o Brasil possui tanta água".
Além de água em abundância, o Brasil tem mais de 8 milhões de quilômetros quadrados, muita terra fértil e um bom clima. Israel tem apenas 28 mil quilômetros quadrados, terra pobre, clima hostil e péssimas condições de água. Apesar disso, li no jornal desta semana que Israel acaba de alcançar uma renda per capita de US$ 13 mil enquanto que nós no Brasil, com uma fartura de dar inveja, não chegamos aos US$ 3.000.
Israel transporta água de regiões longínquas através de uma complexa rede de aquedutos e reservatórios e, ainda assim, consegue manter uma agricultura que se "dá ao luxo" de exportar algodão, amendoim, frutas, legumes e flores, enquanto que nós, no meio da referida abundância, estamos na iminência de importar trigo, feijão e arroz.
O que faz tanta diferença? Educação. Em Israel o ensino é obrigatório dos cinco aos 16 anos e gratuito até os 18 anos. Entre nós, cerca de 20% dos brasileiros com mais de 15 anos não sabem ler ou escrever e 75% dos trabalhadores têm menos de quatro anos de escola.
O Brasil começa amanhã mais uma tentativa de estabilizar sua moeda. É evidente que a redução drástica da inflação dará melhores estímulos para investir e criar empregos. Mas, na sociedade moderna, os empregos custam caro e demandam muita educação. Portanto, por mais êxito que tenha o Plano Real, o Brasil terá de fazer, urgentemente, uma verdadeira revolução no campo da educação se, de fato, queremos chegar ao desenvolvimento sustentado. Do contrário, tudo será efêmero.
O grande problema no campo educacional é o mau gerenciamento dos recursos. Estudos do Banco Mundial indicam que uma pequena parcela do dinheiro liberado em Brasília chega às salas de aula. O grosso é consumido por uma burocracia inchada, desvirtuada e gulosa –sem falar no desperdício que ocorre nas infindáveis reuniões de professores– um verdadeiro esporte para os que não gostam de dar aulas. Dados de São Paulo me levam a concluir que a qualidade do nosso ensino público poderia ser triplicada através de simples rearranjos nas escalas de trabalho e melhor qualificação dos professores.
A comparação entre Israel e Brasil é impressionante. Os israelenses, desprovidos de tudo e constantemente ameaçados pela guerra, colocam-se no patamar das nações mais avançadas do mundo. O Japão, nas mesmas condições, atingiu um dos mais altos IDH –Índice de Desenvolvimento Humano da ONU. Nós, sem guerra e com tudo o que uma nação poderia almejar, temos um dos mais baixos IDH.
Todos sabem que a educação é prioritária. Os candidatos são os primeiros a trombetear isso no rádio e na TV mas nenhum deles se dispõe a dizer "como" vai promover a referida revolução educacional.

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