São Paulo, domingo, 17 de julho de 1994
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O programa que mudou o Brasil - 2

LUÍS NASSIF

De 1985 a 1989, grupos de técnicos da Petrobrás e do BNDES trabalharam o conceito de "integração competitiva" do Brasil na economia internacional. O grupo assumiu cargos relevantes na administração Collor, levado pela ex-ministra Zélia Cardoso de Mello.
Em 26 de junho de 1990, foi anunciado o programa de abertura da economia, consistindo das seguintes etapas:
1) Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade, como instrumento de política industrial e comércio exterior. Através do programa reconhecia-se a questão micro (de capacitação das empresas) como instrumento fundamental na reestruturação competitiva;
2) Fim da reserva da informática, tornando o computador mais acessível ao conjunto das empresas nacionais;
3) Revisão do Código de Propriedade Industrial (que ainda não saiu do papel);
4) Cronograma de redução de tarifas de 36 mil itens, em 36 meses;
5) Privatização como instrumento de política industrial –idéia que não foi posta em prática por Eduardo Modiano, o responsável pela tarefa.
Gerenciamento
A fim de que o programa não fosse tolhido pela falta de continuidade, todos os documentos tinham capítulo especial dedicado ao seu gerenciamento. Foi nessa definição que surgiu a idéia da constituição das câmaras setoriais.
Além disso, fugiu-se de um outro vício do serviço público, que era a montagem de comissões burocratizadas.
Decidiu-se, de um lado, que o programa não teria orçamento próprio nem estrutura burocrática. De outro, que no médio prazo seriam criados instrumentos permanentes de execução, a salvo de interferências do governo.
A idéia foi imediatamente comprada pelo então presidente Fernando Collor, que, a partir de certo momento, passou a coordenar pessoalmente as reuniões do grupo.
Com a queda de Zélia, o programa ganhou fôlego inesperado. O novo ministro Marcílio Marques Moreira trouxe para a Secretaria Nacional de Economia a ex-ministra Dorothéa Werneck, que, na qualidade de técnica do Ipea, havia sido incumbida pelo grupo de trabalhar as relações capital-trabalho. E conseguira o feito inédito de obter apoio de trabalhadores para o programa, em pleno governo Collor.
Dorothéa elegeu o programa como meta prioritária e trouxe Antonio Maciel para secretário-adjunto. As câmaras setoriais adquiriram um dinamismo especial.
Governo Itamar
Com a queda de Collor, nos primeiros meses de governo Itamar o programa se manteve exclusivamente graças ao novo ministro da Indústria e do Comércio, José Eduardo de Andrade Vieira, já que a concepção do plano estava anos luz à frente da compreensão de Itamar.
De qualquer modo, o que foi plantado foi colhido.
A idéia das câmaras setoriais foi comprada por quatro entre quatro líderes das eleições presidenciais. A vetusta Confederação Nacional da Indústria encontrou finalmente sua vocação –a de coordenadora do PBQP em nível nacional.
O Prêmio Nacional de Qualidade tornou-se fundação privada, financiada por 400 grandes grupos. O Sebrae deixou de ser um valhacouto de políticos, virou fundação com controle e gestão privada e está atuando firmemente na preparação de uma futura geração de empresas.
Hoje em dia, qualquer avaliação sobre o futuro do país vai buscar as razões mais profundas de otimismo nas mudanças econômicas deflagradas pelo programa.
A história há de reconhecer a importância desse grupo de jovens inconformistas, que aprendeu que o verdadeiro homem público deve ser íntegro com seu país e suas convicções, agindo permanentemente como agente de transformações.

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