São Paulo, domingo, 17 de julho de 1994
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Fla-Flu em torno de Parreira é cego e bocó

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DA REVISTA DA FOLHA

A chegada do Brasil à final, com a melhor campanha da Copa, aguçou um ocioso Fla-Flu entre opositores e defensores de Parreira. A discussão vai ganhando ares partidários e revestindo-se de uma radicalização cega e bocó.
O bate-boca baseia-se em falsas questões. A mais grosseira é a crença em que, vencedor, o esquema de Parreira e suas opções individuais se comprovariam como o único caminho possível para nos levar ao título mundial. A derrota, ao contrário, atestaria que o Brasil deveria voltar a investir no "futebol alegre" de outros tempos.
Vamos por partes:
1. Copa do Mundo é uma competição que se decide em jogos eliminatórios. Nem sempre vence a regularidade, como num torneio de pontos corridos. Um azar –e o azar existe em futebol– pode tirar um grande time do caminho do título. Se esquema tático por si só ganhasse Copa, a Holanda seria bicampeã. Se o maior número de craques levasse ao triunfo, o Brasil venceria em 50 e 82.
2. O esquema de Parreira é antigo e tem como principal mérito a tentativa de reduzir a margem de intervenção do acaso. Antes de tudo, procura bloquear a ação ofensiva do adversário, para depois pensar no gol. É um 4-4-2 que às vezes trabalha com líbero –como foi o Mauro Silva contra a Suécia. Como o Brasil tem tradição de boa técnica, nosso 4-4-2 pode ser mais eficaz e criativo que o dos outros.
3. Não existe esquema tático sem jogador. Eles podem determinar o êxito e o fracasso dos melhores e piores sistemas de jogo. Romário e Bebeto dão ao 4-4-2 brasileiro um poder ofensivo especial. Jogássemos com uma dupla mediana no ataque e seríamos a Suécia morena.
4. O esquema obviamente seria melhor caso utilizasse um meio-campo mais inventivo. Aqui entram dois fatores. O primeiro é a pouca oferta de craques no setor. Deve-se conceder a Parreira o fato de ter reservado lugar para um meia mais ofensivo –no caso, a ser encarnado por Raí. O segundo é que, sem grandes talentos, o treinador poderia, ainda assim, ter optado por uma combinação mais ágil e veloz, recorrendo a jogadores como Cafu, Leonardo e Mazinho (que acabou entrando no lugar errado).
5. É especialmente na convocação e na escalação dos jogadores que Parreira costuma errar na mosca. Basta dizer que seu time ideal não contava com Romário. E que, com problemas no meio-campo, optou por levar cinco atacantes e, bem... convocou Paulo Sérgio.
6. Parreira sempre preferiu manter seu esquema ao invés de variá-lo a depender do adversário. Talvez a principal fonte de irritação tenha sido esse excesso de rigidez em momentos que era possível soltar o time e oferecer à torcida aquele salário mínimo de cintilância a que todos temos direito.
Mas é evidente que a seleção, com todas as imperfeições, cresceu. Jogou muito bem contra a Holanda e fez um fulgurante primeiro tempo contra a Suécia –quando criou oportunidades de alta qualidade.
Agora, por favor, Parreira. Ganhe essa final!

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