São Paulo, quinta-feira, 21 de julho de 1994
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Sobre vitórias e derrotas com um 'mas'

MATINAS SUZUKI JR.
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

Meus amigos, meus inimigos, a imprensa americana, que foi tão generosa com a seleção brasileira durante toda a Copa, começou a esboçar as suas primeiras observações críticas.
O alimento dessas críticas –em tom bastante moderado, é verdade– foi o zero a zero de domingo, na final da Copa. O "USA Today", por exemplo, foi um dos jornais que mais elogiou o Brasil.
Na sua edição de anteontem, havia um artigo temendo que o rumo do futebol brasileiro fosse o estilo defensivo europeu, o que acabaria com o espetáculo.
E sem espetáculo, lembra o "USA Today", qualquer esporte perde o interesse. Sem jogadores habilidosos, o futebol pode virar algo parecido com atletismo, apenas homens correndo sobre a grama.
Lembrando que a seleção da Fifa escolheu três jogadores defensivos (Jorginho, Márcio Santos e Dunga) entre quatro brasileiros, ele sugere, nas entrelinhas, que está nos pés do Brasil manter aceso o fut.

Costuma-se dizer que não se pode discutir com a vitória. Em termos da lógica interna da competição, a vitória é absoluta: uma vitória representa pontos, representa um título etc.
Mas há vitórias que viram livros, viram capítulos de livros e há vitórias que vão para os apêndices, para as notas de rodapé, para as obrigatórias citações de final de volume.
"USA Today" lembrava que a vitória brasileira na Copa de 94 será daquelas que estarão sempre citadas com um asterisco: venceu a Itália por 3 a 2 na disputa de pênaltis.
Meus amigos, meus inimigos, de fato não se discute com a vitória. Mas há vitórias com o "mas" logo a seguir, e as vitórias sem o "mas". Assim como há derrotas com um "mas" logo a seguir.
Por exemplo, os italianos perderam, "mas" estão contentes com o heroísmo da sua seleção. Os holandeses perderam em 74, "mas" são os vencedores na memória eletiva daquela Copa.
Em perspectiva histórica, as vitórias crescem ou diminuem. As derrotas também. A história faz um ajuste de contas a posteriori que, muita vezes, é imperceptível na momentaneidade do triunfo.
Além disso, se não fosse assim, como manter na nossa galeria de super-heróis, os malditos, os excluídos, os –por que não dizer– derrotados maravilhosos, mais extraordinários que os vencedores?
Costumo dizer que o futebol tem um critério seletivo infalível: a memória afetiva. No Brasil, somente ele e a música popular conquistaram este direito psicológico e sentimental inquestionável.
O Brasil perdeu para os italianos em 82. Viva o Brasil de 82, grita a memória afetiva. O Brasil é tetra em 94. Viva o Brasil de 94, gritam os almanaques e as enciclopédias. Mas com o asterisco.
Vejamos o que dirá a memória afetiva.

Sem fazer muito alarde, Carlos Alberto Parreira adotou, em alguns momentos, a mesma tática de Sebastião Lazaroni. Quatro na defesa, mais um líbero, no caso Mauro Silva, um dos grandes.
Taí mais um exemplo de que a derrota de um dia pode ser a vitória no outro.

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