São Paulo, sábado, 30 de julho de 1994
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Lula e FHC discutem o Plano Real

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Colocados lado-a-lado pelos repórteres, FHC e Lula debateram durante mais de 15 minutos após a sabatina da CNBB. Veja os principais trechos:
Pergunta (para Lula) - O sr. fez um comentário a respeito do Plano Real. Aqui, frente a frente, o que o sr. pode dizer?
FHC (interrompendo)- Vai ser um debate particular nosso? Não tem tempo. Depois eu dou.
Lula - Veja, eu acho que todos nós estamos torcendo no Brasil para que a economia brasileira cresca, que dê certo, porque o povo não pode mais sofrer.
O que nós estamos constatando é que na aplicação da nova política, os comerciantes e empresários aumentaram exageradamente os preços.
Eu acho que só tem duas alternativas: eles reduzem preços ou aumentam salários.
FHC - Se o Lula pensasse sempre assim, desde antes, nós tínhamos avançado mais. Mas é bem melhor. Antes tarde do que nunca.
Compreenderam que o nosso esforço foi sério, que é uma coisa para valer, que o Brasil está acima de nós. Acima da minha ação como ministro, das nossas candidaturas.
Tem que lutar mesmo contra os aumentos abusivos de preços. Mas a inflação é o primeiro passo para isto.
Eu acho importante que o Lula tenha dito o que disse aqui. Porque eu acho melhor que ele apóie do que ficar contra. Porque seria ficar contra o Brasil e ele é um patriota, não vai fazer isto.
Lula - O que eu acho é que ter uma moeda forte não é compará-la ao dólar ou quando você anda apenas com uma moeda no bolso. É quando ela tiver um bom poder de compra.
Por exemplo, quando um trabalhador entrar num supermercado e ele sair com a cesta básica lotada e der para ele comer o mês inteiro.
Hoje não está garantindo isto. Não está garantindo porque, se a moeda é forte os preços são fortes. Eu acho que o governo deveria ter intervido (sic), controlado. Batido muito duro.
FHC - O preço da cesta de consumo está caindo todo dia. Em segundo lugar, com o cruzeiro seria muito pior.
Foi um dique para a subida. Não resolve, mas é um passo importante. Se a moeda é forte, não quer dizer que o salário suba junto. Ele aumenta o poder de compra.
Isto aconteceu. Tanto aconteceu que a população está apoiando. A população sente no bolso. Em economia a gente não pode truncar os dados. Não pode usar um argumento falacioso. Dizer que uma moeda forte não melhorou o poder de compra não é verdadeiro.
Agora, o outro passo, agora sim, é o aumento real de salário. Até agora, o salário sempre correu atrás da inflação. Daqui pra frente, com o real, vai ser possível fazer com que haja uma melhoria efetiva do poder de compra.
Lula - O que eu acho que nós temos que ter claro é que, mesmo quando foi colocada em prática a URV, o preço já tinha subido de tal ordem que o salário não teve compensação.
Ontem, o presidente da CUT entrou em um supermercado que é considerado o 11º supermercado mais barato e pediu... ele pegou R$ 59, que é o salário mínimo (liquído) e só conseguiu comprar 55% da cesta básica.
FHC - Demos um passo para melhorar e vamos dar novos passos. Teríamos dado mais, se este plano não tivesse sido atrapalhado. Ele foi atrapalhado, e muito.
Não adianta ficar comparando com o passado, porque o passado era péssimo. Por isto nós fizemos o real. E o povo sentiu que é bom. Porque sem combater a inflação não há condição nenhuma de fazer o que é necessário no Brasil.
Lula - Eu acho que ter uma moeda forte é importante. O que é grave é que você acaba frustrando este povo. Não se pode brincar com o sentimento da população brasileira.
Pergunta - Este empate empate entre vocês nas pesquisas não significa que o povo está confuso?
FHC - O povo começou a ver o caminho certo. A ter esperanças.
Lula - Quando o Collor lançou o programa dele, imediatamente o povo dava 90% de aceitação para o Collor. É preciso ver a longo prazo se a economia brasileira resiste.
FHC - A economia resiste, porque este plano foi feito com cuidado. Com muita objeção do PT e PDT, que atrapalhavam.
Lula - Com tanto cuidado que esqueceram de aumentar o salário mínimo. Há uma diferença básica entre eu e o Fernando Henrique. Ele quer inflação zero, eu quero inflação zero; ele quer moeda forte, eu quero moeda forte. Só que ele quer salário fraco e eu quero salário forte.

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