São Paulo, segunda-feira, 8 de agosto de 1994 |
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Lamarca não serve para substituir Luís Carlos Prestes como mito
CELSO LUNGARETTI
Paiva proclama isenção, mas a escolha de palavras o trai. Esta polêmica começou quando ele gratuitamente me imputou "delação", embora qualquer foca de redação saiba que o termo apropriado para informação arrancada mediante tortura é "confissão". Luto por meu nome e minha honra, contra o patrulhamento ideológico que tenta suprimir opiniões independentes. Ele apóia seu segundo ataque numa biografia montada a partir de depoimentos de "diversos guerrilheiros e sobreviventes da guerrilha". São inconfiáveis. Jacob Gorender entrevistou ex-militantes para escrever "Combate nas Trevas" e foi levado a crer que eu nem sequer pertencia ao "Grupo dos 7" que recriou a VPR no final de 69. Mentiram-lhe descaradamente. Recorreu também Paiva a um ex-sargento do DOI-Codi. Má companhia. Nada testemunhou e tece conjeturas para valorizar-se diante da imprensa. Dá muita importância a eu ter sido levado pela repressão ao Vale do Ribeira. Grandes operações militares são caóticas. Fiquei alguns dias em prisão precária e fui devolvido a São Paulo. Tudo prosaico, mas quem nada viveu é levado pela imaginação. Exemplo: Paiva pensa que treinávamos no Brasil "para evitar o transtorno e o alto custo de enviar guerrilheiros para Cuba". O motivo real era o risco que corríamos ao atravessar fronteiras... Para encobrir seu erro, Lamarca deixou-me fora da lista de presos trocados por um embaixador. E foi para preservar a imagem do "capitão da guerrilha" que a esquerda me transformou em bode expiatório do fracasso da aventura foquista. Mas não conseguiu calar-me. A atual tentativa de reabilitar Lamarca me assusta: jovens acabarão morrendo por causa disto. Então, revelo o que o filme não mostrou. Ele era obcecado por inscrever o nome na história, usando codinomes épicos como (Júlio) César e (El) Cid. Quando um comandante de quartel lançou um desafio pela imprensa, a resposta de Lamarca foi soltar um carro com explosivos ladeira abaixo, matando um sentinela. Cogitou a possibilidade de a VPR sequestrar o delegado Sérgio Fleury, para travarem um duelo de morte que seria filmado e exibido na Europa. Defendeu a retomada à bala do lote de fuzis que a VPR confiou à guarda da ALN e esta organização relutava em devolver. E exigiu que os comandantes nacionais e regionais da VPR fossem até ele na área guerrilheira para prestar-lhe conta de supostos erros, o que deixou a organização acéfala nas cidades e contribuiu para sua quase total aniquilação, na onda de quedas de abril de 70. Enfim, Lamarca não serve para substituir Luís Carlos Prestes como mito. Era apenas um bom atirador e um comandante desastrado. Suas "viúvas" que me desculpem, mas esse caminho só leva a novos banhos de sangue. Texto Anterior: Estréia de 'Ham-Let' termina no escuro Próximo Texto: "Mito" de ex-capitão foi criado pela "repressão" e pela esquerda Índice |
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