São Paulo, segunda-feira, 8 de agosto de 1994
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Ruandeses voltam pelo oeste, fogem pelo leste

DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

Caminhões da ONU pegaram centenas de refugiados exaustos nas estradas que ligam os campos do Zaire a Ruanda e os levaram de volta para a capital, Kigali.
Mas a leste, lado oposto do país, milhares de hutus –etnia majoritária derrotada na guerra civil– fogem para a Tanzânia, com medo de vingança dos tutsis da vitoriosa Frente Patriótica Ruandesa.
Nos campos da área de Benaco, na Tanzânia, entre 500 e 5.000 pessoas se somam todos os dias aos 500 mil hutus lá refugiados.
Há um fluxo estável de cerca de 5.000 ruandeses voltando ao país, depois da fuga de mais de 1 milhão provocada pela ofensiva final da FPR, que agora detém o poder.
A maioria dos refugiados nos campos do Zaire ainda teme retornar, apesar das epidemias de cólera e disenteria que chegaram a matar 1.800 pessoas por dia.
"Acho que quando essas pessoas souberem que podem voltar com segurança e dignidade, mais virão", disse Jerry Van Mourik, do ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados).
"Não temos medo, eles vão nos perdoar", disse o pastor Samuel Havugimana, referindo-se aos tutsis, agora no poder.
As estimativas são de que pelo menos 800 mil refugiados no Zaire ainda estejam nos campos da região de Goma e que pelo menos 25 mil tenham morrido.
O comandante-em-chefe das Forças Armadas dos EUA, general John Shalikashvilli, foi a Kigali ontem. Ele defendeu emprego de mais tropas da ONU para atrair os refugiados.
Há temores de um novo êxodo, desta vez no sudoeste de Ruanda. As tropas francesas que guardam hutus em uma "área de segurança" vão embora em 22 de agosto e devem ser substituídas por contingentes africanos.
"Espero que não haja um vácuo quando eles saírem", disse um porta-voz do ACNUR. A França insiste que seus 1.200 soldados remanescentes serão retirados.
Em quatro meses de guerra civil, calcula-se que mais de 500 mil pessoas tenham sido massacradas, principalmente tutsis e hutus moderados, favoráveis a dividir o poder com os rebeldes da FPR.
Os responsáveis são milícias hutus e o Exército, fiéis ao presidente Juvenal Habyarimana, morto em 6 de abril.
A morte dele em um atentado até hoje não esclarecido reiniciou a guerra civil, que estava suspensa desde agosto de 1993.
O novo governo estima que já tenham voltado 60 mil membros de famílias tutsis exiladas desde o levante hutu de 1959 –que acabou com a monarquia feudal que os tutsis exerciam em Ruanda.
Anteontem à noite, os recém-chegados à capital lotaram uma casa noturna e dançaram ao som de uma canção da FPR que diz: "Estamos voltando para casa porque somos os vencedores".

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