São Paulo, terça-feira, 9 de agosto de 1994 |
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'Lituma' mistura terror, romance e feitiçaria
JOSÉ GERALDO COUTO
Lançado no ano passado na Espanha, o romance entrelaça uma delicada história de amor com uma trama de aventura e suspense em torno de desaparecimentos misteriosos ocorridos nos confins dos Andes peruanos. O cabo Lituma (que havia aparecido como personagem secundário no romance "A Casa Verde", de 1966) é destacado para cuidar de um posto da Guarda Civil junto a uma estrada em construção na serra, e vê-se em meio a uma realidade caótica e terrível, em que se acumulam relatos de ataques terroristas cada vez mais próximos e histórias desencontradas de feitiçaria e canibalismo. Entre uma barbaridade e outra, Lituma dá ouvidos às histórias que seu assistente, o jovem Tomás Carre¤o, como uma Scherazade da selva, lhe desfia toda noite, sobre seu caso de amor com uma prostituta mais velha, Mercedes, a quem salvou das garras de um bruto. Llosa disse à Folha que se serviu da narrativa romântica como um contraponto aos episódios de terror político e fanatismo para que a história não ficasse "demasiado asfixiante". Fez mais que isso: introduziu um elemento de humanidade comovente em um mundo terrível, enlouquecido e sem piedade. Pelo menos no universo recriado por Llosa, o amor vence o terror. Este painel peculiar de um Peru profundo é construído com uma habilidade narrativa incomparável. Salta-se de um tempo a outro, de um lugar a outro, de uma cena a outra, num espaço às vezes não maior que o de um parágrafo, numa polifonia tão vertiginosa como a de "Conversa na Catedral". Relatos em estilo quase jornalístico de ataques do Sendero Luminoso ou de represálias do Exército são justapostos a sugestões de cerimônias dionisíacas praticadas pelos índios da cordilheira, presididas por um dono de bar chamado justamente Dionisio, que aliás foi o pseudônimo usado por Vargas Llosa ao inscrever o livro no prêmio Planeta, da Espanha (que acabou vencendo). Se a vitória de Alberto Fujimori foi um desastre para o Peru, pelo menos devolveu à literatura de língua espanhola um de seus mais perfeitos narradores. Resta esperar que a sereia da política profissional não o seduza mais. Livro: Lituma nos Andes Autor: Mário Vargas Llosa Tradução: Josely Vianna Baptista Nº de páginas: 256 Preço: R$ 13,50 Texto Anterior: Sobre os puxa-sacos Próximo Texto: Lamê; Almofada; Bavaroise; Viaduto; Mentol; Alfinete Índice |
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