São Paulo, segunda-feira, 22 de agosto de 1994
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Amigos 'salvam' órfãos na hora da perda

PRISCILA SÉRVULO
DA AGÊNCIA FOLHA

Não era para acontecer, mas acontece. Perder o pai ou a mãe ainda na adolescência é duro, todo mundo sabe. Mas quem passou pela experiência garante: a vida continua, apesar da tristeza.
O pai da estudante de administração Cíntia Patricio Ragazzo, 20, morreu quando ela tinha 13. "No começo, senti muita falta, mas em dois ou três meses fui me acostumando", disse.
Cibele diz que agora é difícil pensar nisso. "Quando surge papo sobre os pais em uma roda de amigos eu fico sem graça."
A mais velha das irmãs, Carla, 25, diz que na época foi o namorado que ajudou a superar a perda. Juntos até hoje, devem se casar no final do ano.
A psicóloga Maria Ângela Siena Waeidle, 40, considera comum alguém assumir o papel da mãe ou do pai. "Geralmente o mais velho, ou o mais responsável, para fazer uma dupla."
Waeidle diz que os mais novos também participam da transferência. "É aconchegante saber que alguém cuida de você."
A estudante do 2º colegial Sabrina Lima Moussalli, 16, perdeu a mãe quando tinha nove anos e, este ano, teve que enfrentar a morte do pai.
"Dá um aperto muito grande, um sofrimento indescritível; me pergunto como vai ser o meu futuro", diz.
Ela conta que não tinha "muita noção" na época da morte da mãe. "Fui aprendendo aos poucos a conviver com a perda. O meu pai passou a fazer o papel de pai e mãe. Agora não, eu estou sem os dois."
Sabrina disse que está tendo muita ajuda dos amigos e dos seus padrinhos, que são os seus tutores. Ela mora com a irmã Fabíola, 20.
A estudante Ana Regina Bou Anni, 19, perdeu a mãe quando tinha 14. A mãe morreu de câncer no estômago, um mês após descobrir a doença. "Teve gente que falou que no meu lugar iria se matar. Isso não é conselho que se dê e acho que a vida não acaba", diz Ana.
"Tem muita gente que tem mãe e não tem a vida que eu tenho. A morte é uma coisa da vida. Sei que um dia eu também vou perder o meu pai e a vida vai continuar."
O pai de Diego Araújo Azzi, 13, que está na 7ª série, morreu há um ano. "Ele fumava muito e estava doente, por isso a gente já estava meio preparado."
"O dia do enterro foi bem chato. Quando terminou, nós fomos comer na casa da minha tia. Daí percebemos que não tinha acabado, que a gente ainda tinha amigos."
E agora é Diego quem dá o conselho: "Por mais que seja triste, as pessoas continuam sendo suas amigas, a vida continua, e todo mundo passa por isso."

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