São Paulo, sábado, 3 de setembro de 1994
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Cassino de jogo do bicho

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Realizou-se em Brasília, de 23 a 25 de agosto, o 1º Simpósio de Jogos no Brasil, com apoio da Federação de Agentes Lotéricos. Compareceram delegados de todo o Brasil para uma ampla reflexão sobre o tema. Foi-me dada ocasião de expor as razões pelas quais a Igreja se posiciona convictamente contra a indústria de cassinos.
Há, infelizmente, alguns deputados que propõem projetos de lei favoráveis à abertura de casas de jogo, alegando o incentivo ao turismo, o aumento de empregos e a aplicação de fundos para obras sociais. A discussão é antiga, mas vale a pena responder aos argumentos e mostrar os graves aspectos negativos.
Estamos, sem dúvida, de acordo quanto à necessidade de que haja mais empregos. No entanto, não basta ampliar as oportunidades de trabalho; é preciso, também, que sejam empregos sem riscos morais. Quanto ao turismo, temos outras possibilidades mundialmente apreciadas, graças às belezas naturais. Aliás, os indicadores turísticos atestam que o aumento de turismo motivado por cassinos é pouco significativo. As vantagens da obtenção de recursos para fins sociais podem e devem ser alcançados por outras vias.
As razões para rejeitar a abertura de cassinos são bem conhecidas. Os jogos de azar apresentam a ilusão de um ganho fácil, desfazendo o apreço ao trabalho honesto e sério. Resulta daí uma confusão na ordem de valores, lesando o horizonte de ideais da juventude e acarretando a ambição e a vontade de acumular riquezas em benefício próprio e exclusivo. Cresce, aos poucos, a atração descontrolada pelo lucro exorbitante, a vida fácil e até a corrupção.
Todos sabemos que o jogo de azar desencadeia um processo de apostas difícil de controlar e cria riscos para o patrimônio familiar, levando a pessoa a lances cada vez maiores para compensar o que perdeu ou alcançar novos ganhos. Segue-se, assim, o desatino de quem, em minutos, destrói pela roleta os recursos necessários à manutenção do lar e à educação dos filhos.
O cassino, além disso, fomenta uma série de outros desmandos morais. Incentiva os horários noturnos, prejudicando a família e os compromissos de trabalho, facilita o uso imoderado de bebidas e até a droga, com a consequente violência de atitudes. Aumenta a prostituição. Nos cassinos, lavam-se os dólares. Que pais ficariam tranquilos percebendo que seus filhos ganham a vida nestes locais?
A reunião dos lotéricos, em Brasília, despertou interesse, também, sobre a avaliação ética a respeito do jogo do bicho, uma vez que alguns consideram mal menor a sua legalização, aproximando-os das loterias e outros jogos regulamentados. A ninguém, no entanto, passa despercebido o fato de que o jogo do bicho, além de ser um jogo de azar, está ligado a uma rede perigosa que domina, com violência, os pontos de jogo e associa-se, não raro, ao narcotráfico. Nada disso pode ser aceito.
Tudo isso foi claramente dito na manhã de 25, no encontro organizado pelos lotéricos. Não posso deixar de estranhar, portanto, o editorial de um jornal em São Paulo (29/08, pág. A-3) a respeito de minhas afirmações. Esteve o articulista presente? Fique certo de que sou contra a abertura de cassinos. Rejeito o jogo do bicho. Sou, também, contra os jogos populares de azar, embora lhes caiba juízo ético mais benigno.
É bem diferente o Brasil que queremos e que esperamos construir com a graça de Deus.
D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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