São Paulo, segunda-feira, 5 de setembro de 1994
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Mudança na Fazenda

A rápida indicação de Ciro Gomes para a Fazenda sem dúvida contribui para atenuar o impacto da troca de comando na economia em meio a um plano de estabilização. Não diminui, porém, a surpresa com o lamentável episódio da demissão de Rubens Ricupero, causada pelas afirmações informais do ex-ministro transmitidas por um descuido da Rede Globo e publicadas na íntegra por esta Folha.
Tão graves quanto chocantes, as declarações –feitas sem que o ex-ministro soubesse que estavam sendo captadas por parabólicas– ofereceram a um país aturdido uma mostra acabada de atitudes e visões inaceitáveis num homem público.
A imagem positiva que Ricupero consolidara junto à sociedade magnificou ainda mais o espanto e a decepção, fazendo do caso um contra-exemplo do ponto de vista da moralidade pública que nem o "mea culpa" feito pelo ex-ministro ontem é capaz de compensar.
No que se refere ao aspecto econômico, a escolha de Ciro é decerto bem-vinda. Ao garantir a permanência da equipe técnica do ministério, o novo titular da Fazenda assegura desde logo a continuidade do programa econômico.
A experiência passada de Ciro Gomes sugere ainda que ele deverá ter condições de assumir as tarefas de negociação e de marketing que Ricupero vinha cumprindo –de forma até satisfatória, diga-se– no programa econômico. Isso é importante à medida que, ao lado da solidez técnica do plano, também a sustentação política das medidas e a batalha da credibilidade são fundamentais para a estabilização.
A escolha tem assim um efeito tranquilizador face à incerteza provocada pela demissão de Ricupero na delicada fase atual do programa econômico, que exige atento monitoramento e vários ajustes de rota.
Já na esfera política, o rápido afastamento do ex-ministro vem no sentido de reafirmar a preocupação do presidente em passar uma imagem ética e responsável, e pode atenuar o impacto do escândalo.
De outro lado, a vinculação da atividade do ministério com a campanha de Fernando Henrique Cardoso, abertamente admitida por Ricupero, abre uma larga margem para ataques contra o uso da máquina em favor da candidatura tucana.
O PT, como se sabe, andava à procura de um fato novo para tentar alterar os rumos da campanha e decerto tentará explorar o escândalo ao máximo. Com Ricupero já fora do ministério, porém, é incerta a magnitude do dividendo eleitoral que a estratégia pode render ao PT.
O mais importante, de todo modo, é que o escândalo não afete as expectativas quanto ao plano econômico. Por mais perplexo que o país possa ter ficado, o combate à inflação é uma meta histórica, incomparavelmente mais importante do que o comportamento de um ou outro governante. Os ministros passam, o esforço pela estabilização deve continuar.

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