São Paulo, domingo, 11 de setembro de 1994
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O Brasil não cresce mais à noite

THOMAS E. SKIDMORE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando cheguei ao Brasil pela primeira vez, há mais de três décadas, o país era conhecido como a grande exceção. Todos ríamos de comentários do tipo: "O Brasil cresce à noite, enquanto os políticos dormem" ou "O Brasil não pode cair no abismo porque é grande demais".
Os brasileiros me garantiram que as leis econômicas normais não se aplicavam ao sul do Equador. A história parecia justificar esse otimismo. Até a década de 60, o Brasil teve um histórico de crescimento fenomenal, em conjunto com uma inflação endêmica.
Então, a estagnação do início dos anos 60 contribuiu para a ruptura da democracia e o nascimento do regime militar mais longo do século no Brasil. Se o governo autoritário obteve sucessos na década de 70, fracassou redondamente na primeira metade da década de 80.
No momento o Brasil sai de mais uma década de recessão, mas ainda não descobriu o segredo do crescimento sustentado. A atual campanha está centrada em como encontrar esse segredo.
Uma coisa é certa. O Brasil não vai atingir o crescimento sustentado nem maior justiça social pensando que é único. Embora as frases de 30 anos atrás não sejam repetidas agora, a mentalidade persiste.
Quando pergunto a meus amigos brasileiros sobre exemplos de política econômica, eles respondem: "O Chile é um país minúsculo –quase nem se iguala ao Rio", ou "A Argentina tem um PNB menor do que São Paulo", ou "O México é uma virtual dependência dos EUA".
Com essas palavras, relegam esses países a segundo plano; eles não teriam qualquer relevância para o Brasil. Conclusão: o Brasil não tem nada a aprender com nenhum outro país.
Sendo norte-americano, já estou dolorosamente familiarizado com esse raciocínio. A política do meu país sofre da mesma mentalidade. Os EUA seriam a grande exceção.
O Brasil não pode se dar ao luxo de seguir os passos dos EUA. Abrigando o maior bolsão de pobreza extrema da América Latina (a região Nordeste), o país precisa fazer escolhas sábias. Nem o socialismo nem o neoliberalismo oferecem uma resposta.
O socialismo não funcionaria, por várias razões. Qualquer tentativa de efetuar uma redistribuição radical da renda provocaria uma reação contrária destrutiva por parte da classe capitalista. A fuga de capitais e a interrupção dos investimentos aleijariam a economia.
Em suma, uma estratégia socialista poderia conseguir conquistas sociais a curto prazo, mas não conseguiria atingir e manter o crescimento. Nesse ponto, a única alternativa é uma tomada total da economia pelo Estado, como em Cuba.
O neoliberalismo seria igualmente pouco promissor. Poderia trazer crescimento a curto prazo, mas faria pouco para reduzir as desigualdades sociais. O México e a Argentina constituem exemplos marcantes. Mesmo o Chile ainda não recuperou os níveis salariais de 1970.
Qual será a resposta, então? Tem de haver um esforço simultâneo para aumentar os investimentos e melhorar o bem-estar social.
Com o risco de irritar meus amigos brasileiros, cito a conclusão de um estudo do Banco Mundial sobre os "tigres" asiáticos: em todos os casos encontraram-se três fatores –política macroeconômica estável, investimento em capital humano e abertura para a economia mundial.
Incidentalmente, estas são lições que mereceriam ser ouvidas por meu próprio país.

THOMAS ELLIOT SKIDMORE, 62, doutor pela Universidade de Harvard (EUA), brasilianista desde 1961, é autor dos livros "Brasil: de Getúlio a Castello" e "Brasil: de Castello a Tancredo".
Tradução de Clara Allain

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